“Mustaine: Memórias do heavy metal”
Dave Mustaine e Joe Layden – tradução de Marcelo Barbão
Lançado no Brasil em 2013
Não dá para dizer que Dave Mustaine teve uma vida fácil nem mesmo depois que explodiu com o Megadeth. Mas também é impossível afirmar que ele soube se administrar, em ambos os âmbitos – pessoal e profissional.
A sua sincera autobiografia, “Memórias do heavy metal” (Editora Benvirá), escrita em parceria com Joe Layden, mostra os dois lados. Sim, a trajetória de Dave Mustaine é repleta de percalços e obstáculos. Mas nem sempre ele parecia se movimentar o bastante para se esquivar dos problemas.
No que diz respeito a movimento, Dave Mustaine se moveu bastante para que o Megadeth se tornasse um nome de referência. É engraçado comparar o cenário da indústria musical daqueles tempos e de hoje em dia, por meio dos depoimentos de Mustaine. Antigamente, parecia, ao mesmo tempo, mais fácil e mais difícil de se chegar ao estrelato. Parecia prático arrumar pessoas que estivessem dispostas a investir em seu trabalho. Mas o avanço tecnológico fez com que, por exemplo, o disco “Killing Is My Business… And Business Is Good!” tenha custado US$ 8 mil e a qualidade sonora não seja tão boa.
Mas Dave Mustaine, que integrou o Metallica por praticamente um ano, fez o necessário em duas oportunidades. Primeiro, colaborou diretamente com o estilo sujo, forte e revolucionário do Metallica. Segundo, capitaneou o Megadeth, que cumpriu a promessa de ser mais agressivo do que a sua ex-banda.
“Memórias do heavy metal” tem, claramente, seus exageros. Dave Mustaine é um homem de ego notável e, em algumas situações – especialmente ocorridas na década de 1980 -, parece não dar o braço a torcer. Mas a recomendadíssima obra é sincera na maioria das páginas e admite o principal: que a continuidade de Mustaine no Metallica foi muito comprometida pelo seu abuso de álcool e drogas, intensificado nos anos seguintes. Três capítulos (do terceiro ao sexto) são dedicados a esta fase.
As décadas iniciais da vida de Dave Mustaine são descritos de forma mais sincera ainda nos dois capítulos iniciais. A trajetória complicada da problemática família de Mustaine se refletiu na turbulência passada pelo músico até, provavelmente, os anos 2000. Mas o ruivão soube se virar – muito bem, diga-se de passagem.
Os anos 1990, que ironicamente marcam uma nova fase de Dave Mustaine – casado com Pam Mustaine, sua companheira até hoje -, parecem ser mais acelerados. Mustaine se afundou de vez em alguns momentos. A formação mais conhecida do Megadeth (com Nick Menza e Marty Friedman) também parecia ser a mais gananciosa – justamente, imagino, pelo poder musical incontestável. Por conta disso, são poucos os depoimentos reveladores de Mustaine sobre essa fase. É aparente que ele passava pouco tempo com os demais integrantes. A rotina estafante provavelmente decepciona um pouco o leitor, que naturalmente espera muito sobre esses anos, mas pouco tem em “Memórias do heavy metal” – o único defeito marcante do livro, talvez.
O renascimento de Dave Mustaine já se fazia necessário antes mesmo do problema em um nervo de seu braço esquerdo, em 2002, que quase findou o Megadeth e a sua própria carreira. A banda demonstrava desgaste. O renascimento quase milagroso em 2004 mostrou que o Megadeth ainda tinha lenha para queimar.
E teve. “Memórias do heavy metal” foi finalizado antes do lançamento de “Endgame”, um dos melhores discos do Megadeth ao meu ver. Aparentemente com um norte na vida (enfim!), Dave Mustaine só parece ter eternos problemas para digerir a conflituosa passagem pelo Metallica. Anos depois do livro, ele topou participar da turnê “Big 4”, ao lado do Slayer, Anthrax e sua ex-banda. Aparentemente está tudo bem agora. Mas Mustaine é uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento. Esperamos que os estouros sejam apenas artísticos: o genial ruivão é, incontestavelmente, um dos maiores frontmen do rock.