Do céu cinzento de São Paulo (SP) para a praia. Não foi só o local de gravação do novo EP do NX Zero que sofreu uma mudança notável. O quinteto paulista agora trabalha de forma independente. Desde “Diálogo?” (2004), primeiro CD da banda, o grupo não apostava em um trabalho sem gravadora major. Desta vez, por opção, o grupo se desligou da Universal Music e lançou o EP “Estamos no começo de algo muito bom, não precisa ter nome não” (Independente, virtual) pelo iTunes.
Já é natural que o NX Zero se modifique a cada disco. “Sete chaves” (2009) é mais pesado que a trinca inicial, mais puxada para o emocore. Já “Projeto Paralelo” (2010) traz muito do rap – e várias participações, como as de Gabriel o Pensador, Chorão e Negra Li, entre outros. “Em comum” (2012) inicia uma tendência prosseguida no atual EP: as guitarras distorcidas deram espaço a melodias mais harmoniosas e com um leque mais amplo do pop rock ao reggae.
O amadurecimento musical presente no EP é creditado, de acordo com o guitarrista Fi Ricardo, ao trabalho mais solto na praia e o método independente de autoprodução. O processo foi gravado em vídeo e será lançado no YouTube. Ao mesmo tempo em que divulga “Estamos no começo de algo muito bom, não precisa ter nome não”, o NX Zero planeja um novo disco, ainda sem título, que deve ser lançado após o carnaval de 2015. Algumas músicas já estão prontas.
Confira abaixo a íntegra da entrevista exclusiva com Filipe Ricardo, guitarrista do NX Zero:
IGOR MIRANDA: Gradualmente vocês estão abandonando o peso e as guitarras distorcidas para um som mais clean. Nesse EP, isso acontece em todas as faixas com exceção da última. A leveza é algo notável no trabalho de vocês desde o último disco, “Em comum”. Mas curiosamente o anterior, “Sete chaves”, é o disco mais pesado de vocês na minha visão. Acham que já fizeram tudo o que poderiam em uma vertente mais pesada, daí por isso a mudança? Ou a mudança é algo mais orientado a mercado?
FILIPE RICARDO (NX ZERO): “A última música ainda tem mais uma pegada com guitarra, distorcida, parecida com o que fazíamos antes, uma mistura meio com reggae. As 3 outras pelo fato de ter feito ele na praia, essa onda, acabou saindo mais leve. E estamos valorizando mais o groove, o embalo das músicas. Mesmo que não conheça a música, você sente o embalo. Estamos priorizando, também, a criação de texturas musicais, mesmo com a guitarra sem distorção. Temos uma série de outras músicas feitas para um disco que sai ano que vem, que tem coisas pesadas sim, sempre faremos, mas esse EP específico ficou mais nesse astral por ter sido feito na praia, 1 mês lá. Quem gosta de NX Zero, vai continuar gostando porque a essência desse EP é a mesma. E para quem já tem interesse maior por timbres, por arranjos e tem um gosto mais amplo, vai sentir que tivemos preocupação com uma nova forma de compor. È um trabalho bem despretensioso”.
Ainda sobre mercado, esse é o primeiro lançamento independente de vocês desde o disco “Diálogo?”, de 2004, e o primeiro também a não contar com a produção do Rick Bonadio. Por que o fim da parceria com o Bonadio e com a gravadora? Nesse atual formato que a música se promove hoje, a gravadora não estava mais ajudando? E o que muda, no geral, agora que vocês estão independentes?
“O fim da parceria aconteceu naturalmente. É uma questão de interesses e prioridades que ficaram diferentes. Somos gratos por tudo o que fizemos até hoje com ele. Voltamos agora em uma nova forma, vimos que estávamos diferentes depois das gravações na praia. Qualquer banda que tiver a oportunidade, deveria fazer esse exílio. Dadas as devidas proporções, os Rolling Stones também já fizeram isso. Quebra a rotina do horário de estar obrigatoriamente produtivo. Qualquer hora é hora de gravar. O dia a dia junto também é importante, é mais leve, sem ser aquela pressão de horário”.
“Tira onda” é, de longe, a música mais extensa da carreira de vocês registrada em um disco. Nos outros álbuns, as músicas não passam de 5 minutos. Curiosamente, é a única faixa do EP com participação autoral dos cinco integrantes, algo que também pouco aconteceu em outros álbuns. O processo de composição também está mudando?
“Valorizamos o clima das músicas. Tanto nas músicas do EP quanto nas do álbum que chega no próximo ano. Valorizamos bastante o groove, as levadas. Estamos menos preocupados com a estética e um pouco mais com a arte. Sabemos trabalhar no formato radiofônico, mas é bacana unir os dois lados. Se a música pede algo, você precisa respeitar isso. Pode pedir mais ou pedir menos. Estamos mais seguros de nosso trabalho, talvez pela idade ou pelo que já fizemos”.
Na música “Uma gota no oceano”, deu pra perceber uma influência muito bacana do Charlie Brown Jr, cujo líder, o já falecido Chorão, participou do CD Projeto Paralelo. Como era a relação de vocês com o Chorão, tanto pessoalmente quanto nessa questão de enxergá-lo como influência, alguém que chegou antes e deixou a marca no rock nacional?
“Sempre admiramos muito o Charlie Brown Jr, foi um dos primeiros shows que vi quando moleque. Depois de todos os acontecimentos, ficamos bem mexidos. Foi difícil de entender. Isso se refletiu na música, a letra diz bastante coisa. Pelo que aconteceu com o Chorão e o Champignon, serve até como uma homenagem. Ficou na cabeça. E é um prazer essa comparação”.
Vocês estão entre os artistas que mais venderam música em formato digital até hoje. Já se sentem mais confortáveis com lançamentos virtuais do que físicos? O que você acha sobre essa substituição do formato virtual em relação ao físico?
“Como esse EP é independente, já fizemos em trabalho virtual porque o nosso público sempre foi fiel à internet. Temos vontade de fazer um vinil no futuro ou algo em formato físico que seja relevante para a pessoa. Hoje em dia mesmo o CD caiu um pouco. Para quem gosta, o vinil é uma melhor opção do que um CD. Ainda é uma transição, mas o CD não é tão necessário hoje em dia. Dá para ouvir música no celular com qualidade boa. O arquivo digital é uma praticidade. Ter tudo o que quiser no celular, coloca no carro, enfim… não dá para andar com 100 discos. Esse é o grande segredo. E isso aconteceu também cofotografia, vídeo, etc. O vinil já traz o momento, a forma de ouvir. Tem que parar de fazer tudo para prestar atenção no som. Não é música ambiente”.
Esse EP serviu de combustível para um disco que vai ser lançado depois do carnaval, certo? Daí vocês já partem para uma nova turnê? Quais os planos para o NX Zero agora?
“Já temos algumas músicas prontas e estamos compondo outras. Gravaremos tudo em 2015. “Vamos seguir” é um single forte e significativo na nossa carreira, mas temos outras engatilhadas. Faremos turnê do EP até o lançamento do disco, com uma nova roupagem para as músicas, bem de acordo com o EP. No novo disco ainda teremos essa preocupação com os arranjos. Estamos mais conscientes dos espaços que precisamos preencher nas músicas, para não quebrar o ritmo delas. No disco, haverá outro tipo de peso. Tem a ver com a densidade. Mas sempre explorando o mais difícil, que é o simples que precisa ser bem-feito”.