Adele: “25” (2015)
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Adele é um ponto fora da curva em meio à música pop atual. Talentosa, a cantora ganhou muito destaque ao fazer, basicamente, o que muitos artistas já traziam no passado, especialmente em tempos mais estrelados da indústria fonográfica: ela compõe muito bem, definiu e tem controle do direcionamento artístico de sua carreira e sabe escolher os profissionais com os quais trabalha. Além disso, guarda um raro poder em suas cordas vocais. Já é uma das grandes cantoras da música contemporânea. Tudo isso com o frescor dos anos atuais.
Ao lado de bons nomes que ainda eram considerados jovens na produção, como Mark Ronson e Jim Abbiss, lançou o seu primeiro disco, “19”, em janeiro de 2008. Fez sucesso. Nada, porém, que se comparasse à repercussão do álbum seguinte – o maduro “21”, que saiu também em janeiro, mas de 2011. Repetiu a dose com Abbiss, mas chamou produtores mais consagrados, como Paul Epworth, também compositor, e Rick Rubin, além do emergente Ryan Tedder. Chegou a um resultado fantástico, com um dos melhores full-lengths do século XXI – até o momento, é claro.
É natural que exista uma enorme expectativa acerca de “25”. O terceiro disco de Adele chegou ao público oficialmente na sexta-feira (20), quase cinco anos após “21” que bateu dezenas de recordes em termos de vendas e repercussão por todo o mundo. A crítica especializada e os fãs de música pop já definem o novo trabalho como o grande lançamento de 2015, que foi um ano fraco para a indústria fonográfica. O mercado desse segmento foi conduzido, basicamente, por registros do ano passado, como “Uptown Special” (Mark Ronson) e “1989” (Taylor Swift).
Há quem diga que a escassez de concorrência fez de Adele um grande nome. Considero isso um erro. “21” é um disco fantástico. Inspirado e inspirador. Para mim, porém, títulos de “melhor lançamento do ano” para “25” (a não ser pela expectativa que o envolveu nas últimas semanas) sejam, sim, exagero. A britânica escorrega em alguns excessos que só devem agradar os fãs da tradicional melancolia de suas composições.
Adele trabalha a melancolia em suas músicas como ninguém. Seja por letras, performance vocal ou orientação de arranjos. Em “25”, porém, a cantora não conseguiu trabalhar com esse sentimento de forma versátil. Em muitas músicas, baterias e instrumentos mais fortes de percussão foram dispensados ou ficaram em segundo plano, para destacar pianos e passagens sintetizadas. É “deprê” demais e inventivo “de menos”.
“Hello”, primeiro single, reflete boa parte das faixas de “25”. Entre versos caídos e refrães imponentes, a voz de Adele ecoa com o mesmo poder que a fez conquistar o mundo entre 2011 e 2012. Os quase cinco minutos de duração podem parecem exagerados, mas a canção é gostosa de se ouvir. Em outra vibe, “Send My Love (To My New Lover)” flerta um pouco com o reggae e traz batidas sintetizadas. É uma das músicas mais legais do álbum, vozes impostas de forma delicada, refrão grudento e batida um pouco mais rápida.
Os sintetizadores ganham força em “I Miss You”, que demora para começar, mas soa atraente pela voz de Adele. A ponte e o refrão soam dissonantes, não só internamente como na passagem entre uma e outra, e não fazem a canção crescer. A partir daqui a fórmula verso/refrão/verso/refrão duplicado, com pontes estratégicas, começa a dar uma sensação de “já ouvi isso antes”. “When We Were Young” volta a dispensar batidas em boa parte de seu andamento. Os vocais da britânica, no entanto, brilham com muito feeling. A pegada é bem puxada para o R&B americano, especialmente quando os backing vocals aparecem.
“Remedy”, única faixa do álbum que contém a assinatura de Ryan Tedder nas composições, também aposta no formato voz + piano. O refrão tem uma linha melódica gostosa, mas a falta de violões e percussão começa a incomodar. Adele nunca foi de fazer músicas para pistas de dança, mas também não era tão repetitiva como aqui. “Water Under The Bridge”, finalmente, coloca uma pegada diferente no disco. Em um pop meio soturno, os vocais se entrelaçam com o instrumental sintetizado. Finalmente, os backing vocals são bem explorados no refrão, que cresce com o coletivo. Lembra algumas canções de Madonna nos anos 1990.
“River Lea” segue a mesma linha “fase dark de Madonna” – elogiada por Adele, por meio do disco “Ray Of Light” (1998), em recente entrevista à Rolling Stone. Serve como descanso em relação aos gritos, pois a cantora opta por tons mais graves.
Com início orquestrado, “Love In The Dark” volta a colocar o pé no acelerador e deixar o carro, praticamente, em ponto morto. A proposta gospel volta, com algumas batidas sintetizadas no refrão – e só. Adele solta a voz em alguns trechos do refrão. A tática de aumentar todos os volumes nas partes principais da música são usadas, mais uma vez, de forma descarada. A canção não cresce pela melodia, mas pela altura. Só não é uma faixa totalmente dispensável porque, além dos vocais sempre incríveis, a orquestra de apoio dá uma sensação diferente.
Finalmente, ouço um violão: é em “Million Years Ago”, que começa com o instrumento e dá um campo interessante para a britânica mostrar seus tons graves. E fica nisso. Poderia crescer, mas não tem variações. “All I Ask”, conduzida de forma majoritária por teclas, foi feita em parceria com Bruno Mars – e dá para imaginá-lo cantando as linhas vocais entoadas por Adele. Boas opções melódicas, no geral. Ao fim, uma variação de tom que mostra porque, à frente do microfone, a loira é tão ovacionada.
“Sweetest Devotion” encerra o disco com total influência gospel. O instrumental soa orgânico (enfim, bateria) e o refrão cresce por mérito, não por volume. As cordas fazem um bom trabalho: de violoncelos a guitarras. Ao menos, a última impressão deixada é muito boa.
Em suma, é decepcionante pensar que os fãs esperaram quase cinco anos para ter “25”. Trata-se, no geral, de um disco “seguro” demais ? e não no sentido de firmeza, mas de repetição. Adele colocou aquilo que sabe que pode dar certo. Impera o meio termo: tem momentos fortes e fracos. Faixas com potencial de hit, como “Hello”, “Send My Love (To My New Lover)” e “Sweetest Devotion”, dividem espaço com canções que preenchem espaço ou não foram bem desenvolvidas, como “Million Years Ago”, “Love In The Dark” e “I Miss You”.
Mais conservadora, a britânica apostou em fórmulas e formatos já experimentados nas últimas décadas para rechear o seu novo álbum. Espere muitas “Someone Like You” e poucas (ou nenhuma) “Roliing In The Deep”. A pitada “indie” e até experimental de “21” foi embora. Os fãs vão ficar satisfeitos, vai vender bem, mas dificilmente fará história. Aquém do antecessor.
Nota 5
1. Hello
2. Send My Love (To Your New Lover)
3. I Miss You
4. When We Were Young
5. Remedy
6. Water Under the Bridge
7. River Lea
8. Love in the Dark
9. Million Years Ago
10. All I Ask
11. Sweetest Devotion