“Ídolo” é uma palavra de significado forte. Define-se como algo ou alguém muito admirado e venerado por outra pessoa.
Com o tempo, praticamente excluí esse termo do meu vocabulário. Artistas e nomes consagrados das áreas que tenho afinidade cometem tantos erros em questões mundanas, seja por ego ou ideologia, que, às vezes, o tal ídolo me traz repulsa. Declarações e atitudes de Ted Nugent, Phil Anselmo, Gene Simmons e Axl Rose são só alguns dos exemplos. Merecem créditos pelo trabalho musical e só – de resto, são contestáveis e, em casos como o racismo de Anselmo e as acusações de violência doméstica de Rose, até condenáveis.
Tenho críticas ao modelo do Rock And Roll Hall Of Fame, que ignorou, por décadas, nomes realmente importantes do rock – e ainda ignora, mas, justiça seja feita, tem “se desculpado” nas últimas induções. Ainda assim, tenho admirado como a instituição e sua respectiva cerimônia anual, que costuma ter apresentações com os homenageados, têm escancarado, mesmo que de forma involuntária, o quão egocêntricos são esses sujeitos comumente chamados de “ídolos”.
O “roteiro” do episódio recente com o Deep Purple aconteceu, de forma semelhante, com KISS e Guns N’ Roses em anos anteriores. Bandas que não contam mais com suas formações clássicas simplesmente fogem de uma reconciliação, nem que seja por uma noite, e decepcionam fãs que gostariam de ver uma apresentação. Enquanto o KISS se absteve de tocar durante o evento, o Guns N’ Roses teve que ser representado por Myles Kennedy, já que Axl Rose não compareceu para a homenagem – nem Izzy Stradlin.
O caso do Deep Purple chama ainda mais a atenção, já que o manager da banda teria pedido para que a presença de Ritchie Blackmore fosse vetada – o próprio guitarrista revelou isso, pelas redes sociais. Em comunicado oficial, Ian Gillan deu uma desculpa esfarrapada. “Fomos confrontados com uma decisão difícil ao descobrir que Steve Morse e Don Airey não estavam qualificados para a indução. Então, entramos em acordo com a instituição. Os membros homenageados subirão ao palco para o discurso e a formação atual fará a parte musical”, disse o vocalista. Ou seja: David Coverdale e Glenn Hughes também estarão no evento, mas se apresentarão. Vale destacar que Gillan disse a seguinte frase para a revista Roadie Crew, em 1991, sobre “Burn” e “Stormbringer”, discos gravados com Coverdale e Hughes: “eu não preciso daquelas merdas”.
O ego dos envolvidos é tamanho que o presidente e CEO do Rock And Roll Hall Of Fame, Joel Peresman, disse que os músicos do Deep Purple não gostariam de se apresentar com Ritchie Blackmore. Mesmo considerando que, muito provavelmente, esta seja a última chance de reunião da formação clássica da banda – os caras já são setentões -, a oportunidade foi ignorada.
A chata caretice de estrela do rock atingiu outro patamar, já que, além da birra juvenil, o caso envolve um suposto pedido para vetar o convite de Ritchie Blackmore para a cerimônia. É comum que músicos tenham suas desavenças e há o livre arbítrio para que cada um decida o que quer fazer, mas o guitarrista não faz mais parte do grupo desde 1993 – e, provavelmente, eles não se veem desde então. Precisa de tudo isso?
Não adianta ter composições que mencionem perdão, amor, gratidão, amizade e afins em seu catálogo se o rancor permanece durante tantos anos. O caso do Deep Purple é o mais bizarro dos últimos tempos. A lista, porém, é enorme: músicos consagrados – e velhos, supostamente maduros – de outras bandas, seja dentro ou fora do Rock And Roll Hall Of Fame, se mostraram tão pirracentos quanto crianças birrentas nos últimos anos. Não dá para chamar ninguém de “ídolo”.