À primeira vista, Jonathan Wilson pode não ser, por si só, um nome de grande destaque para fãs de música em geral. No entanto, basta citar seu currículo para que muitos se identifiquem. Atualmente, Wilson é o guitarrista e co-vocalista da banda de Roger Waters (ex-Pink Floyd), com quem gravou o álbum “Is This The Life You Really Want?” (2017) e excursiona na turnê “Us + Them”, de passagem pelo Brasil. Ele também já gravou com artistas do porte de Father John Misty, Erykah Badu e Elvis Costello, bem como produziu álbuns ou músicas de Chris Robinson (ex-Black Crowes) e Roy Harper, entre outros.
Além de ter trabalhado com tantos nomes, Jonathan Wilson mantém uma carreira solo que já conta com três álbuns lançados nesta década: “Gentle Spirit” (2011), “Fanfare” (2013) e o mais recente, “Rare Birds”, que chegou a público no início deste ano. O novo álbum foi o principal tema da entrevista exclusiva que Wilson concedeu por telefone, mas o músico também falou sobre seu trabalho com Roger Waters.
O processo de concepção de “Rare Birds” foi um tanto desafiador para Jonathan Wilson, já que ele precisou conciliar suas gravações com o trabalho ao lado de Roger Waters, tanto em “Is This The Life You Really Want?” quanto na turnê “Us + Them”. “Venho trabalhando em meu disco desde 2016 até momentos diferentes de 2017. Trabalhei por seis meses no disco de Roger Waters. Também tinha as coisas do Father John Misty. A agenda era apertada”, disse ele sobre os compromissos ao lado de Waters (foram realizados mais de 140 shows com o ex-Pink Floyd entre 2017 e 2018, além das sessões de gravação prévias do álbum e de ensaio para a tour) e Misty (ele produziu o penúltimo álbum do cantor, “Pure Comedy”, lançado em abril de 2017).
No fim das contas, valeu o esforço: “Rare Birds” é, certamente, o melhor disco da carreira solo de Jonathan Wilson. O álbum dispensa a veia folk presente nos registros anteriores e aposta em uma sonoridade mais heterogênea, que flerta, em especial, com a psicodelia. Seria uma influência de Roger Waters? “Há trechos em que fiz de propósito, como aquele som ‘viajado’, do estilo do Floyd, soando dessa forma porque eu estava fazendo meu disco ao mesmo tempo em que gravava com ele. Então, há a mesma sonoridade, os mesmos equipamentos. E o álbum dele é influenciado pelo meu som, porque você ouve meus instrumentos”, explicou Wilson, que é apresentado por Waters nos shows como “o hippie residente” de sua banda – não à toa, como é possível perceber em estética musical e até visual de suas fotos de divulgação e clipes.
A transição do folk para uma sonoridade mais mista também foi premeditada como um todo, segundo Jonathan Wilson. “Eu estava tentando, especificamente, fazer isso de propósito. Não são músicas feitas para tocar em um camping, mas sim, quando se está ‘nas nuvens’”, disse ele, que também revelou capricho nas letras. “Há essa vibe de ‘amor perdido’, mas também quis incluir temas que gosto de ler ou ouvir em um disco, como coisas surreais ou de psicodelia. Também há mensagens de positividade, assim como tristeza e escuridão”, afirmou, sobre a ideia por trás das composições líricas.
Empolgado com o resultado de “Rare Birds”, Jonathan Wilson promete voltar ao Brasil – da próxima vez, com sua banda solo – para promover seu trabalho. “Nas pausas de turnês de Roger Waters, estou fazendo a minha turnê. Começamos na Inglaterra, tocamos em Seattle (Estados Unidos)… a ideia é voltar ao Brasil durante a primavera (outono no Hemisfério Sul) e trazer minha banda. Estou animado”, disse.
Convidados de peso
Como Jonathan Wilson é bem relacionado no meio musical, não era de se espantar que “Rare Birds” trouxesse participações de destaque. Lana Del Rey, por exemplo, canta na música “Living With Myself”, enquanto o parceiro de longa data Father John Misty deixa sua colaboração em “49 Hairflips”. Já o artista new age Laraaji, conhecido por compor ao lado de Brian Eno, está em “Loving You”. Por fim, o quarteto Lucius – que conta com Jess Wolfe e Holly Laessig, backing vocals da banda de Roger Waters – deixam sua marca na faixa título.
“Foi ótimo contar com eles, são alguns de meus melhores amigos. Não houve grande pressão: foi como trabalhar com amigos, escolher a música que se encaixaria melhor para cada um deles. É mais sobre a natureza da contribuição do que sobre a pessoa e sua ‘força’ enquanto ‘estrela’. É ótimo ter pessoas tão talentosas assim, especialmente quando você as conhece, já sabe como elas podem soar”, disse Jonathan Wilson sobre os convidados.
O trabalho com Waters e a polêmica no Brasil
Jonathan Wilson revelou, durante o bate-papo, que sua entrada para a banda de Roger Waters foi “inesperada”. “Começamos com o disco. O produtor (Nigel Godrich) é meu amigo e me chamou para tocar a guitarra, porque é um posto complicado para se encontrar alguém que não soe tanto como o passado, mas que, ainda assim, possa contribuir. Aconteceu de meu estilo se encaixar. Então, surgiu o convite para entrar na banda de turnê e era demais para deixar de lado. No entanto, veio de forma inesperada. Tem sido muito divertido, fantástico”, afirmou.
Vale destacar que Jonathan Wilson assumiu grandes responsabilidades ao entrar para a banda de Roger Waters. Além de ter participado do primeiro disco solo do ex-Pink Floyd em 25 anos – em menção a “Amused To Death” (1992), já que “Ça Ira” (2005) é uma ópera –, ele se juntou à formação durante a turnê “Us + Them”, que carrega um dos shows mais políticos de Waters até hoje.
Na nova tour de Roger Waters, além de muitas músicas já terem forte tom político, as mensagens no telão deixam claro o posicionamento do artista: o de “resistência”, especialmente contra os interesses de grandes poderosos, chamados de “porcos” por Waters. O conceito gerou polêmica nos Estados Unidos e em países da Europa, mas, no Brasil, a controvérsia foi ainda maior. O ex-Pink Floyd foi vaiado logo no primeiro show da perna brasileira da tour, em São Paulo, ao incluir o presidenciável Jair Bolsonaro em uma lista de líderes “neofascistas” reproduzida no telão, que também expôs a hashtag #EleNão, também um manifesto contra Bolsonaro. Nas apresentações seguintes, o nome do político foi escondido por uma tarja, com os dizeres “ponto de vista político censurado”, e a hashtag não foi mais exibida.
Em entrevista ao programa “Fantástico”, da TV Globo, Roger Waters também disse que não entendeu o que estava acontecendo com relação às vaias. Só depois, ele compreendeu que houve um erro técnico ao expor a hashtag #EleNão em um momento equivocado. “Durante a música ‘Eclipse’, eles colocaram a hashtag que desagradou a todos. Foi um erro. Era para ter aparecido mais tarde durante a música ‘Mother’, durante a parte ‘Mother should I trust the government?’ (‘mãe, devo confiar no governo?’). Seria nessa parte que apareceria ‘#EleNão’, aí faria sentido. Mas colocar no meio da ‘Eclipse’ foi um erro do meu time. Aquela parte da música era para aparecer pirâmides, lasers coloridos. Estávamos amando uns aos outros. […] Naquele momento do show, em todos os lugares que tocamos no mundo todo, todos ficam tão contentes nessa parte, todos aplaudem. Aí me perguntei: ‘o que está acontecendo?’”, afirmou.
O ponto de vista de Jonathan Wilson foi semelhante – ele também não entendeu o que estava acontecendo quando as vaias tomaram o estádio paulistano Allianz Parque. “Roger Waters tem chamado a atenção de políticos por todo o mundo, o tempo todo, durante a turnê inteira. Por exemplo, ele fez isso em Budapeste, onde o presidente (da Hungria, Viktor Orbán) tem ideias semelhantes, de extrema-direita. Ele é muito bem informado sobre o que está acontecendo. Mas, sim, não estávamos entendendo o que, exatamente, estava acontecendo naquela hora. E, basicamente, somos a banda e estamos lá para tocar as músicas. O que é dito no microfone é uma questão dele”, disse Wilson, sobre a polêmica em terras tupiniquins.
Que chato esse cara