“Balance”, o álbum da interrompida transição do Van Halen

Após álbum lançado em 24 de janeiro de 1995, banda nunca mais viu normalidade em sua trajetória

O último suspiro do Van Halen enquanto uma banda “normal” aconteceu há um quarto de século. Após “Balance”, o 10° álbum da discografia, a banda nunca mais foi a mesma ao retirar, de vez, a palavra “estabilidade” de seu vocabulário.

Quando se observa “Balance” diante da discografia do Van Halen, soa como uma mudança brusca com relação ao que se estava fazendo antes. Porém, uma análise mais atenta permite notar que, na verdade, esse disco era apenas o início de uma transição que poderia ter evoluído melhor nos trabalhos seguintes se não fossem os problemas que o grupo enfrentaria no futuro para se firmar.

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Vale lembrar que “Balance” já foi concebido em meio a problemas internos. Curiosamente, segundo o guitarrista Eddie Van Halen, tudo começou quando ele parou de beber, em outubro de 1994. Foi quando ele relatou ter notado que outras pessoas estavam no controle de sua vida – e fez o possível para afastá-las.

As decisões tomadas foram apoiadas pelo irmão, o baterista Alex Van Halen, mas não agradaram ao vocalista Sammy Hagar. A situação ainda evoluiria até a saída do cantor, em 1996. Contudo, antes disso, ainda seria produzido o último álbum com Hagar na banda.

“Balance” reflete não só esses problemas internos do Van Halen e a recém-conquistada sobriedade de Eddie, como, também, o próprio momento da música. Naquele período, o rock já havia concluído sua transição ao alçar o rock alternativo como um todo, incluindo o grunge, ao estrelato. As bandas consolidadas antes da década de 1990 tentavam, de alguma forma, correr atrás do prejuízo.

Grupos como Bon Jovi e U2, por exemplo, conseguiram fazer essa transição sem comprometer o sucesso conquistado anteriormente. Vários outros nomes não obtiveram o mesmo êxito. O Van Halen parecia se inspirar nos colegas que mantiveram a carreira em alta.

Nasceu, assim, “Balance”: um trabalho de sonoridade mais “séria”, com produção mais sóbria e construções harmônicas que faziam referência não só àquele momento vivenciado pelo rock, como, também, admitiam influências de outros elementos, até mesmo fora do estilo. Há, ainda, as letras que abordam temas mais conscientes – ou, pelo menos, de forma menos juvenil –, o que ainda chama atenção em meio ao catálogo de um dos nomes mais “farristas” do hard rock.

‘Balance’, faixa a faixa

A climática abertura “The Seventh Seal” é um reflexo disso. O teor místico da letra foi conquistado em decorrência da luta de Eddie Van Halen para permanecer sóbrio. Foi uma das três músicas que o guitarrista compôs em 1 hora e meia – as primeiras que ele criou sem estar bêbado ou chapado em anos, talvez décadas. O resultado é bem convincente.

Segunda faixa de “Balance”, “Can’t Stop Lovin’ You”, também é o maior sucesso do álbum. A composição de Sammy Hagar apresenta sua ex-esposa como eu lírico – o cantor acreditava que ela ainda o amava. Musicalmente, uma canção de grude infalível que, não à toa, foi a responsável por alavancar as vendas do disco e emplacar até no Brasil, pela trilha sonora da novela “História de Amor”.

Em seguida, “Don’t Tell Me (What Love Can Do)” e sua aura pesada discute, entre outros assuntos, o suicídio de Kurt Cobain, líder do Nirvana, no auge de sua carreira. Hagar aponta, em sua letra, que Cobain poderia ter sido salvo pelas pessoas ao seu redor, mas que ele foi abandonado por alguma razão. Será? Só posso dizer que a música é muito boa.

“Amsterdam” e “Big Fat Money”, com a guitarra de Eddie na linha de frente, resgatam um pouco do Van Halen de outros tempos – ou, pelo menos, o Van Halen de “For Unlawful Carnal Knowledge” (1991) –, com letras menos sérias e melodias mais próximas do hard rock “tradicional”. Divertem. A primeira de três instrumentais, “Strung Out”, prepara terreno para a balada “Not Enough”, conduzida por piano e certa influência da música gospel. Sammy Hagar brilha nesta canção, que requer audição em momento ideal para ser compreendida.

Discutindo mudanças que “não podem ser feitas da noite para o dia”, “Aftershock” traz o instrumental como destaque, com Alex Van Halen em grande momento. O momento de “baixa” de “Balance” vem em seguida, com duas faixas instrumentais: a vinheta “Doin’ Time” e “Baluchitherium”, centrada em Eddie Van Halen. Apesar dos bons solos e ambientação na segunda, a audição já começa a ficar dispersa.

Por sorte, “Take Me Back (Deja Vu)” chega em seguida. De letra nostálgica, a linda balada convence por muitos aspectos: da melodia de construção cuidadosa às performances individuais, que vão dos vocais bem gravados às guitarras de timbres excepcionais. “Feelin’” fecha o álbum com uma aura mais alternativa – talvez, por isso, seja a faixa de sonoridade mais datada da tracklist, apesar de Eddie Van Halen arregaçar no solo principal.

Bons frutos para o Van Halen

Mesmo com tantos problemas, o resultado apresentado em “Balance” soa acima da média, tanto em termos artísticos quanto comerciais. O álbum não vendeu tão bem quanto seus antecessores e o Van Halen precisou ceder e virar atração de abertura do Bon Jovi na parte europeia da turnê de divulgação, porém, o trabalho chegou a mais de 2 milhões de cópias vendidas nos Estados Unidos naquele período.

O sucesso de “Can’t Stop Lovin’ You”, inclusive em mercados considerados “alternativos” – como a própria América do Sul –, foi um feito e tanto em um momento que o rock já não fazia mais parte da música pop. Diferente da década de 1980, onde os dois gêneros se entrelaçavam, os anos 1990 marcaram uma verdadeira dissociação.

Além da consolidação do hip hop, o R&B contemporâneo de artistas como Mariah Carey e o country pop de nomes como Sheryl Crow estavam em alta no ano de 1995. Não havia tanto espaço para o rock de arena. Virou coisa de tio. Na época, bandas como o Van Halen remaram contra essa maré e transcenderam a bolha do estilo.

A falta de “balance” após ‘Balance’

“Balance” era o álbum que o Van Halen precisava para entrar, de vez, na década de 1990. Além disso, parecia construir uma sonoridade tão peculiar que, para mim, é o único trabalho do “Van Hagar” que não poderia ser interpretado de forma alguma pelo então ex-vocalista, David Lee Roth. O problema é que, como apontado anteriormente, a transição iniciada com esse disco não é concluída, devido aos eventos que aconteceriam em seguida.

De modo bem resumido, os tais eventos, cronologicamente alinhados, são: a saída de Sammy Hagar, a volta-relâmpago de David Lee Roth, a entrada de Gary Cherone para gravar o inconsistente “Van Halen III” (1998), hiato e retorno de Hagar para uma turnê catastrófica até, enfim, Roth reassumir a vaga de vez – só que sem o baixista Michael Anthony, dispensado de forma criticada para Wolfgang Van Halen, filho de Eddie, assumir sua vaga.

Sammy Hagar deixou o Van Halen no ano seguinte a “Balance”, em meio a uma série de conflitos com Eddie, Alex e o novo empresário, Ray Danniels, que era ex-cunhado do baterista. O manager assumiu a função que era de Ed Leffler, responsável pelo gerenciamento da banda por décadas, porém, falecido em 1993.

As tretas ficaram irremediáveis após a gravação da música “Humans Being”, feita para a trilha sonora do filme “Twister”. Eddie Van Halen fez mudanças na composição após não gostar do que Sammy Hagar havia apresentado. Em seguida, a banda foi convidada para registrar uma segunda faixa para o longa, que acabou se tornando a instrumental “Respect The Wind” – já que Hagar discordava de uma segunda canção.

Outras decisões passaram a ser tomadas sem o aval de Sammy Hagar até que o vocalista, enfim, saiu em 1996. Ele até voltou em 2003, mas abandonou o grupo novamente, em 2005, diante de um Eddie Van Halen sofrendo com o alcoolismo – algo que ele havia superado, justamente, nos tempos de “Balance”.

Em entrevista à Guitar World, em 1997, Eddie Van Halen conta: “Existiram vários conflitos envolvendo Ray Danniels, Sammy e a banda desde que parei de beber em 2 de outubro de 1994. A coisa ficou tão feia que eu comecei a beber de novo”. O “balance” (termo em inglês para “equilíbrio”) que o álbum buscava acabou sendo jogado no lixo pouco tempo depois.

Dá para imaginar como o Van Halen poderia ter seguido sem todos esses problemas iniciados, curiosamente, após Eddie parar de beber? Não só “Balance”, como “Humans Being”, também, servem de amostra. Infelizmente, isso não foi possível – e os fãs ficaram em terreno instável, com “Van Halen III” e a redenção quase 15 anos depois, com “A Different Kind of Truth” (2012).

Sammy Hagar (vocal, guitarra)
Eddie Van Halen (guitarra, violão)
Michael Anthony (baixo)
Alex Van Halen (bateria)

Músicos adicionais:

Steve Lukather (backing vocals na faixa 7)
The Monks of Gyuto Tantric University (cânticos na faixa 1)

1. The Seventh Seal
2. Can’t Stop Lovin’ You
3. Don’t Tell Me (What Love Can Do)
4. Amsterdam
5. Big Fat Money
6. Strung Out
7. Not Enough
8. Aftershock
9. Doin’ Time
10. Baluchitherium
11. Take Me Back (Deja Vu)
12. Feelin’

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Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

1 COMENTÁRIO

  1. Mais uma vez o parabenizo pelo perfeita resenha, não somente do álbum em si, mas que sempre traz algumas informações adicionais.
    De fato, faltou a banda Balance após o Balance, e nessa formação “Van Hagar”, concordo que foi o único álbum escrito mesmo para ele cantar.
    Duas coincidências marcam essa leitura que acabei de fazer: A primeira que adquiri o cd no sábado (26/12) e a segunda por não lembrar das músicas que foram compostas pra integrar a trilha sonora de Twisted , que recordo carinhosamente assistir no cinema quando fora lançado.
    Enfim, é uma banda maravilhosa, que não chegou onde realmente poderia, mas o feito histórico começou quando lá no início, roubavam a noite do Sabbath sendo a banda de abertura da turnê americana.
    Forte abraço.

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