Dá para dizer que um dos grandes filmes com temática relacionada à música dos últimos tempos é “Whiplash – Em Busca da Perfeição”, estrelado por Miles Teller (interpretando o personagem Andrew Neiman) e J.K. Simmons (dando vida a Terence Fletcher). Lançado em 2014, o longa mostra a relação complicada entre Neiman, aluno de um conservatório de música, e Fletcher, um professor de bateria extremamente rígido.
Alguns momentos que chegam a parecer exagero são apresentados na produção. Mas, afinal, o que é real ali em termos de música?
Antes de tudo, a primeira coisa real de “Whiplash – Em Busca da Perfeição” é a performance de Miles Teller. O ator toca bateria desde os 15 anos e entrou em um regime intenso de estudo durante a produção do filme, tendo tocado na grande maioria das cenas.
Um dublê de corpo foi usado em alguns closes e há uma trilha sonora no corte final, por cima do som original, mas Teller tocou em praticamente tudo.
E o resto? Para ajudar a separar a ficção da realidade, a Vulture conversou com o músico e professor Mark Sherman, que leciona em grandes conservatórios como o The Juilliard School, na Universidade de New Jersey City, e o New York Jazz Workshop.
O especialista desmistificou alguns dos elementos do filme e mostrou que outros são perfeitamente possíveis.
Dando o sangue
As cenas mais lembradas de “Whiplash – Em Busca da Perfeição” são aquelas em que o personagem Andrew Neiman está se esforçando ao máximo sob a pressão do professor Terence Fletcher. Em muitos momentos, o jovem acaba com as mãos machucadas e muito sangue nas baquetas e peles do instrumento.
De acordo com Mark Sherman, esse tipo de situação é bem pouco realista. Com exceção de alguns calos e bolhas nas mãos – que podem vir a sangrar um pouco -, nada disso acontece.
“As pessoas não sangram desse jeito tocando música. Isso não acontece – e se acontecer, você está segurando as baquetas errado. Você está tecnicamente ferrado se está sangrando. Nunca vi ninguém sangrar.”
Até mesmo o tipo de treinamento que o personagem principal faz em “Whiplash” é pouco próximo da realidade. Há, por exemplo, muitas repetições de um mesmo padrão na bateria – algo que, na vida real, tem pouca aplicação prática na evolução do músico.
Os acertos de Whiplash – Em Busca da Perfeição
Por outro lado, a dedicação é mais do que necessária para conseguir um bom resultado enquanto músico profissional. Nesse sentido, Mark Sherman acha que “Whiplash – Em Busca da Perfeição” acertou. Ele comenta:
“Espero que meus alunos sejam como eu era quando tinha a idade deles. Eu costumava praticar 6 a 7 horas por dia, ia a todas as aulas e ensaios de orquestra. Eram 14 horas por dia na escola todos os dias durante 5 anos. Se você quer ser bom em alguma coisa, você trabalha duro por 10 anos. Pratique constantemente por 10 anos, e você terá o que deseja. É assim que você chega ao próximo nível.”
Até por exigir muita dedicação, a carreira musical pode ser, também, solitária – algo que o filme também acerta ao indicar, segundo o professor:
“A parte em que Andrew termina com sua namorada para perseguir seus sonhos é um ponto válido. O compromisso para se tocar música é como qualquer outra forma de arte. O compromisso de tentar ser um mestre da linguagem poética do jazz é um vício, assim como uma droga, e pode haver muito pouco espaço para uma vida social.
Alguns garotos daqui não conseguem encontrar um equilíbrio. Isso é uma realidade; há muitas pessoas assim. Você se torna um eremita de tanto praticar. Mas sabe… os caras que ficam aqui 10 horas por dia são os que saem por cima na maior parte do tempo.”
A pressão em Whiplash – Em Busca da Perfeição
Terence Fletcher é o professor dos piores pesadelos de qualquer aluno. Xingamentos, ofensas e pressão além dos limites do aceitável são alguns dos elementos que ele oferece ao estudante.
Na vida real, Mark Sherman diz que já trombou com um ou outro “Fletcher” ao longo de sua trajetória, mas longe do que o personagem de J.K. Simmons faz no filme. A pressão existe, mas talvez tenha sido um tanto exagerada pelo diretor do longa, Damien Chazelle.
“Enquanto assistia ao filme, eu pensava em duas coisas. Pensava: ‘esse menino Andrew vai vir ensaiar com uma arma e vai atirar no cara’. O tempo todo, eu achei que seria uma declaração sobre esse tipo de coisa que acontece nas escolas hoje, onde um garoto entra com uma metralhadora e atira em todo mundo. Ou isso, ou o garoto cometeria suicídio.
Me sinto mal que as pessoas sejam levadas a acreditar que você tenha que passar por isso para tentar uma carreira na música ou no jazz. Leciono em um lugar como o Juilliard, que é um dos melhores, e muitos daqueles meninos estão sob muita pressão, sim, mas não esse tipo de pressão. A pressão, no fim das contas, é a pressão que você coloca em si próprio, para sobreviver e ter sucesso na indústria.”
Parece que, felizmente, a realidade não é tão dura assim para quem pretende se tornar um baterista de jazz profissional, por mais que as expectativas e a pressão sejam grandes.
Mas se o realismo não foi tão priorizado em “Whiplash”, a produção cinematográfica certamente foi. Além de ter sido um sucesso em bilheteria e se tornado um clássico cult do segmento, o longa venceu o Oscar em 2015 nas categorias Melhor Ator Coadjuvante (para J.K. Simmons), Melhor Edição e Melhor Mixagem de Som.
* Texto desenvolvido em parceria por André Luiz Fernandes e Igor Miranda. Pauta e edição geral por Igor Miranda; redação e apuração adicional por André Luiz Fernandes.
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Fala um monte mas não responde a pergunta simples e objetiva: que é o baterista real que fez o solo da cena final.
Em nenhum momento prometemos responder a essa pergunta tão específica.