A morte de Marvin Gaye em 1º de abril de 1984 foi uma das perdas mais sentidas da história da música contemporânea, especialmente pelas circunstâncias em que ocorreu. O cantor foi atingido por dois tiros disparados pelo próprio pai, Marvin Gay Sr., após uma vida inteira de relacionamento complicado.
Como era de se imaginar aqui, pai e filho nunca se deram bem. Nem mesmo após Gaye conseguir a fama com sua música, nos anos 1970, os dois conseguiram se reconciliar.
Alberta, mãe do cantor, era quem ficava no meio do conflito. Ela, inclusive, presenciou toda a discussão que acabou por causar a morte do filho, a quem sempre apoiou na carreira musical.
A dura criação
Marvin Gay Sr. era um pastor de uma igreja pentecostal em Washington D.C. notória pelos costumes bastante conservadores em relação a roupas e hábitos diários. Embora fosse conhecido por gostar de vestir com trajes femininos, o líder religioso era extremamente rigoroso com a religiosidade de sua esposa e das crianças – ao todo, eram cinco filhos e um enteado.
Segundo relatos diversos, parte da criação dos filhos envolvia fazê-los repetir versículos da Bíblia de cabeça – se errassem, eram surrados. Além disso, ficavam frequentemente sem comida, já que o jejum os “aproximaria de Deus”, de acordo com as crenças do patriarca. Alberta também seria vítima de ameaças e abusos verbais e físicos.
Com Marvin Gaye em específico, o relacionamento era ainda pior. Desde a concepção, Gay não aceitava o filho, chegando a duvidar que fosse dele. Quando Gaye cresceu, seu pai chegou a acusá-lo de manter um relacionamento incestuoso com a mãe, com quem era bem mais próximo.
A rigidez da criação fez com que Marvin Gaye crescesse ressentido, adicionando a letra “e” ao fim de seu sobrenome tanto para se distanciar do pai, como para evitar que as pessoas dissessem que ele era homossexual. Na vida adulta, também teve relacionamentos também conturbados, onde era abusivo e agia conforme era tomado pelas drogas, logo caindo em uma paranoia de que atentariam contra sua vida e chegando a contemplar o suicídio.
A morte de Marvin Gaye
No fim de 1982, Marvin Gaye um artista já consolidado, lançou seu 17º álbum de estúdio, “Midnight Love”. A turnê de divulgação durou até agosto de 1983, quando o artista voltou para a casa dos pais para cuidar da mãe, que havia passado por uma cirurgia. O cantor vivia um período conturbado, tendo retomado o uso de cocaína após um bom tempo sem a substância.
No natal daquele ano, Gaye presenteou seu pai com um revólver, pois seguia paranoico com a segurança dele e da família. A arma ficou guardada no quarto de Gay Sr. enquanto a relação entre os dois, com o tempo de convivência, voltava a piorar muito, com brigas frequentes.
Na noite de 1º de abril de 1984, após uma discussão sobre documentação da casa em que os pais de Marvin Gaye viviam, o cantor e seu pai iniciaram uma briga física pela primeira vez. Gay Sr. sempre deixou claro que não admitiria a violação desse limite nos desentendimentos com o filho, mas Gaye partiu para as vias de fato de forma bastante brutal, agredindo o pai com chutes.
Os dois foram separados pela mãe, que levou Gaye ao seu quarto e tentou acalmá-lo. Enquanto isso, o pai pegou a arma, entrou no cômodo e fez um disparo contra o peito do filho. Enquanto Alberta corria, Gay Sr. ainda atirou uma segunda vez, escondendo a arma debaixo do travesseiro na sequência.
Os disparos foram ouvidos por Frankie Gaye, irmão de Marvin e também cantor que vivia em uma casa menor dentro da propriedade. Ele foi o primeiro a socorrer Alberta, que, em prantos, avisou ao outro filho o que havia acontecido.
Frankie relatou em sua autobiografia que entrou na casa a tempo de ouvir as últimas palavras do cantor, que sangrava rapidamente:
“Eu tive o que queria. Não consegui fazer isso por conta própria, então ele fez para mim. Está tudo bem, segui o meu caminho, não há nada mais em mim.”
A declaração do cantor em seus últimos momentos corrobora com um depoimento de sua irmã, Jeanne, que afirma que quatro dias antes, Marvin Gaye havia tentado se matar. O cantor chegou a se jogar de um carro em movimento, mas sofreu apenas ferimentos superficiais.
Condenação de Marvin Gay Sr.
Marvin Gay Sr. foi condenado e preso pelo crime. Pouco tempo após sua detenção, foi diagnosticado com um tumor na cabeça, removido no mês seguinte ao assassinato.
O julgamento o sentenciou a seis anos de prisão, embora ele tenha sido considerado culpado de um homicídio culposo, onde não há intenção de matar. No tribunal, expressou o arrependimento pelo que fez:
“Se eu pudesse trazê-lo de volta, eu traria. Eu tinha medo dele. Pensei que iria me machucar. Não sabia o que ia acontecer. Sinto muito por tudo o que aconteceu. Eu o amava. Queria que ele pudesse entrar por aquela porta agora. Estou pagando o preço agora.”
Após cumprir sua pena, Marvin Gay Sr. passou seus últimos anos em asilos. Morreu em 1998, de complicações de uma pneumonia.
Seu filho, Marvin Gaye, segue lembrado como um dos grandes cantores de sua geração, com discos importantíssimos para a soul music e para a música contemporânea de modo geral.
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