Este texto sobre “Ms. Marvel” obviamente não terá spoilers. Mas isso na verdade não é um favor que faço e, sim, uma punição – quem assistir até o fim entenderá o motivo.
Infelizmente, já passou da hora de aceitarmos que a Marvel se perdeu em sua grandeza e nos valores que quer ajudar a imprimir na sociedade. Uma vez que já ficou claro que a Fase 4 do Universo Cinematográfico Marvel (UCM) será a substituição de heróis homens e velhos para dar o lugar a jovens heroínas.
Na teoria, a ideia é justa e importante. Porém, na prática, as coisas não estão saindo conforme o planejado. E não é difícil de entender o motivo.
Há algum tempo, Quentin Tarantino disse em uma entrevista: “nos dias atuais, a ideologia superou a arte”. Em tom de crítica, o lendário diretor de “Pulp Fiction” praticamente previu o que aconteceria com a Marvel Studios e consequentemente, com “Ms. Marvel” – onde a ideologia está acima de tudo, inclusive de uma boa história.
Quem é Ms. Marvel?
A história de série da Disney se passa nos dias atuais, na cronologia que já estamos habituados. A adolescente mulçumana Kamala Khan (Iman Vellani) é uma jovem nada popular, que vive no mundo da fantasia dos heróis e tem como ídolo a poderosa Capitã Marvel (Brie Larson).
Dentro de uma família extremamente conservadora aos costumes mulçumanos, a jovem paquistanesa-americana sofre por não poder ser livre como sonha. Ao mesmo tempo, carrega dentro de si o desejo de praticamente qualquer criança: o sonho de ser uma heroína.
Nos quadrinhos, Kamala Khan tem DNA dos Inumanos, que é ativado após o Raio Negro liberar uma certa toxina na atmosfera. Com o contato de tal substância, ela tem seus poderes despertados e percebe ser capaz de fazer com que seus membros cresçam.
Porém, para a Marvel Studios e seu universo compartilhado, seria complexo demais usar esses poderes porque são os mesmos de Reed Richards, líder do Quarteto Fantástico. Como o grupo de heróis (que ainda deve entrar para o UCM) é mais popular, o estúdio decidiu alterar os poderes de Kamala Khan. Agora, a jovem recebe um bracelete místico que destrava suas habilidades de gerar um tipo de energia cósmica.
Uma obra só com coração
Há de se aplaudir a intenção da Marvel em diversificar e ampliar seu universo, principalmente por meio de personagens que podem se assemelhar com públicos outrora deixados de lado. Hoje, uma garota mulçumana pode se ver na Ms. Marvel, usar suas fantasias, brincar de ter poderes e consumir produtos da mesma.
Porém, a que preço vale esse objetivo?
“Ms. Marvel”, a série, tem um coração absurdo que é dado por boa parte do elenco. Dá para sentir a vida pulsar em cada um deles dentro da obra, especialmente de Iman Vellani. A jovem paquistanês-canadense encaixou no papel de forma perfeita. O brilho nos olhos da protagonista foi o que me fez ir até o último episódio.
Contudo, mesmo com amor, paixão e carisma absurdo, Vellani não consegue segurar sozinha algo deste tamanho. O seriado é mal escrito e traz situações constrangedoras aliadas a efeitos especiais péssimos – uns rabiscos em tela que beiram o ridículo. Assemelha-se a algumas produções da Rede Globo. Rodando dublado, dá para sentir a “experiência vinda do Projac”. Para uma empresa de orçamento bem maior, o resultado está muito abaixo.
Do começo ao fim, excede-se na tentativa de passar uma mensagem sobre diversidade cultural. Ninguém em momento algum demonstra preocupação com a história. E tudo isso é feito por uma ótica muito infantilizada. Você pode estar até criticando um adulto que não gostou de uma série obviamente feita para crianças e adolescentes, mas é fato que não é este público que faz a roda girar neste segmento – até porque muitos adultos precisarão assistir para entender o desenvolvimento do universo compartilhado.
Primeiro prego no caixão da Marvel
A Fase 4 do UCM é um desastre. Perdida e sem foco, traz substituições forçadas e coloca ideologia acima de boas histórias. “Ms. Marvel” parece ser o primeiro prego no caixão do universo compartilhado e a situação pode piorar.
Perdemos nosso Pantera Negra e ainda não sabemos como se dará a substituição. O terceiro filme do Homem-Formiga também já dá sinais de que Cassie (Kathryn Newton), a filha de Scott Lang (Paul Rudd), pode tomar o lugar do pai. Além disso, em 2023 chegará o filme “The Marvels”, protagonizado por Teyonah Parris como Monica Rambeau – que até o momento teve pouco tempo de tela e não conseguiu conquistar –, a carismática Kamala Khan de Iman Vellani e a nada querida Capitã Marvel de Brie Larson, que ainda não caiu nas graças de boa parte do público mesmo sendo tão poderosa. Pode ser que haja um flop.
Apesar de tudo, o último episódio de “Ms. Marvel” agrada. Nos faz lembrar os bons tempos em que a Marvel nos surpreendia. Este capítulo vale a pena. Mas o futuro ainda assim não parece animador. Mais de uma década depois, o primeiro prego está no caixão da Marvel. Quantos outros pregos serão necessários para fechá-lo? Só o tempo dirá.
*Todos os episódios de “Ms. Marvel” já estão disponíveis na Disney+.
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Concordo com tudo o que vc falou. Incluir todas as etnias e dar mais voz às mulheres é louvável, tem que ser feito mesmo, e faz a empresa ficar bem vista aos olhos do politicamente correto. Mas nada disso adianta se não for feito direito. Da Ms. Marvel, só o último episódio salvou mesmo. Do Cavaleiro da Lua, nem isso. Estão abrindo demais o leque, e caindo em qualidade no material.
Só não acho que o caixão esteja próximo de ser fechado, porque ainda tem muita lenha pra queimar, com o Quarteto, com os X-Men, e tudo mais.
Mas fato é que pro grande público, as histórias de super heróis já não chamam tanto a atenção. Pessoas que eu conheço que não são nerds como eu, nem sabem que as séries do Disney+ existem. Muitas nem se ligaram que tem um novo filme do Thor nos cinemas.
Depois do Ultimato, a tendência é a rentabilidade dos produtos Marvel cair mesmo, na minha opinião. Só acho que ainda vai rolar muita coisa, porque quais são as outras opções? Missão Impossível? Velozes e Furiosos? Faz tempo que os únicos blockbusters que valem a pena realmente são os da Marvel.
Como fã de quadrinhos, espero que ainda leve muito tempo pra que os executivos entendam que as mega produções milionárias não são mais viáveis.