“Fascistas!” Quando show do Kiss acabou em confronto entre direita e esquerda

Apresentação realizada no ano de 1980 em Milão, Itália, ficou marcada por tumulto entre extremistas e músicos correndo para se esconder em camarim

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O ano era 1980. Após cinco anos de sucesso crescente nos Estados Unidos, o Kiss finalmente retornou à Europa como uma superbanda, embalados pelo hit mundial “I Was Made for Lovin’ You”. A última passagem do grupo no Velho Mundo havia sido em 1976, quando o quarteto de músicos novaiorquinos – que surgia como o nome de público jovem mais potente de seu país natal e arrastava multidões nos estados industriais do nordeste, Grandes Lagos e meio-oeste americano – se deparou com públicos dedicados, mas ainda pequenos nos países do norte europeu.

No fim da década, a situação era outra. O Kiss já tinha se consolidado como uma referência de sucesso e seu show era um verdadeiro marco cultural na América. Os bons números em vendas de discos no mercado internacional, principalmente a partir do “Love Gun” (1977), e a épica passagem pelo Japão no mesmo ano, quebrando recorde de público dos Beatles, pareciam anunciar agora uma tomada do mundo.

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Não foi o caso. Como é bem sabido, no auge de sua popularidade, o grupo foi tomado por suas turbulências internas e seus dois feudos – Paul Stanley (voz/guitarra) e Gene Simmons (voz/baixo) de um lado, Ace Frehley (guitarra/voz) e Peter Criss (bateria/voz) se afastaram criativa e até geograficamente de forma profunda.

Criss acabou deixando a formação ao fim da turnê do álbum “Dynasty” (1979), mas seu desligamento oficial só se deu no ano seguinte, quando saiu o disco “Unmasked”. Ele toca apenas uma música nos dois trabalhos citados neste parágrafo (“Dirty Livin’”), sendo substituído nas demais por Anton Fig.

https://www.youtube.com/watch?v=SWNYLMUg6B0

Rumo à Europa

Os remanescentes, que à época apostavam em uma sonoridade mais pop de boa aceitação nos mercados europeu e australiano, seguiram com Eric Carr na vaga ociosa e embarcaram em turnê para promover “Unmasked”. O próximo passo para a banda parecia óbvio: seguir para o Velho Continente e tentar construir uma Kissteria do outro lado do Atlântico, já que o público americano parecia ter se saturado dos mascarados.

Datas pela Europa foram marcadas, mas precisaram ser reagendadas, já que eles precisavam de tempo para ensaiar com Carr. Enfim, em agosto de 1980, a monstruosa estrutura de turnê começou a ser mobilizada para atravessar o oceano. Com a popularidade em alta por lá, nada de clubes intimistas no itinerário: as apresentações foram agendadas em arenas e estádios.

“O Kiss é fascista!”

A etapa inicial da excursão seria na Itália, por onde o Kiss iria se aventurar pela primeira vez. E justo naquele país, no dia 2 de setembro de 1980, se deu um acontecimento bastante incomum para a banda até aquele momento.

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Após cerca de uma hora de apresentação no Velodromo Vigorelli, em Milão, para um público estimado de 30 mil pessoas, uma confusão começou a se formar na grade que separa o palco do público. Integrantes da Brigada Vermelha (Brigate Rosse), então grupo de extrema esquerda italiana, se reuniram na área frontal e começaram a gritar:

“O Kiss é fascista! O Kiss é fascista!”

Por mais absurdo que pareça o grito de ordem, o país vivia seus anos de chumbo e polarização em meio à Guerra Fria e a banda era uma manifestação cultural tão facilmente associada a valores da terra do Tio Sam.

Há relatos na imprensa italiana da época de que a manifestação da Brigada Vermelha atiçou representantes de grupos de extrema direita que estavam no show. Deste modo, os dois grupos se engalfinharam. Ao fundo, bandeiras vermelhas, coquetéis molotov e cânticos políticos.

Botas pelo caminho

O autor Chris Lendt narra em seu livro “Kiss and Sell” que membros da Brigada Vermelha chegaram a subir no palco, fazendo que Gene Simmons, Paul Stanley, Ace Frehley e Eric Carr corressem para um distante camarim. No túnel do estádio, ficaram pelo caminho botas, capa e todos os acessórios que pudessem atrapalhar a locomoção.

Com os músicos trancados no backstage, a situação só foi resolvida com a chegada de reforço militar e a expulsão dos militantes do local.

Assustados, mas famosos por cumprir contratos, os integrantes do Kiss retornaram para o palco e concluíram o set, recompensando os fãs que haviam ido ao velódromo para ver um show de rock.

Sorte dos italianos que o episódio não estremeceu a relação de forma definitiva: a banda retornou ao país outras dez vezes. Por motivos justos, levou oito anos até a segunda passagem, em 1988. As demais tours ocorreram em 1996, 1999, 2008, 2010, 2013, 2015, 2017, 2019 e em julho deste ano.

Não há registros do episódio relatado neste artigo, mas uma gravação em vídeo de um trecho do show e um registro completo da apresentação (sem passagens do tumulto) podem ser conferidos abaixo.

https://www.youtube.com/watch?v=I1esDYf8YBI
https://www.youtube.com/watch?v=BgyDZJg4zDI

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Bernardo Graciolli
Bernardo Graciollihttps://igormiranda.com.br/
Bernardo é formado em Relações Internacionais pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e trabalha no setor financeiro. Amante de rock e (principalmente) de Kiss, palpita sobre assuntos que conectam política, história e geografia com a música.

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