Electric Mob soa ainda mais pronto para o mainstream em “2 Make U Cry & Dance”

Agora mais consciente de seu potencial, banda curitibana de hard rock mostra-se mais direta e equilibrada em trabalho radiofônico e diverso

A história de ascensão do Electric Mob é um tanto curiosa. Ainda que tenha sido formado em 2016, o grupo curitibano composto por Renan Zonta (voz), Ben Hur Auwarter (guitarra), Yuri Elero (baixo) e André Leister (bateria) chegou aos ouvidos de muita gente dentro e fora do Brasil em 2020, ano em que saiu seu primeiro álbum full-length, “Discharge”, por meio da gravadora italiana Frontiers Music Srl.

O trabalho foi ancorado pelo single “Devil You Know”, que acumula quase 3 milhões de reproduções no Spotify e mais de 300 mil visualizações em seu clipe no YouTube. Em entrevista a este que vos escreve, Auwarter contou que a faixa ganhou tração nas rádios dos Estados Unidos ao longo de 2020: chegou a tocar 800 vezes por semana nas estações do país.

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Toda essa maluquice aconteceu com o quarteto sem que eles pudessem fazer shows, por culpa da Covid-19. Enquanto um novo álbum não saía, Renan Zonta envolveu-se em projetos da Frontiers como o Brother Against Brother (com Nando Fernandes) e o Skills, supergrupo que reuniu Billy Sheehan (Mr. Big, The Winery Dogs) no baixo, Brad Gillis (Night Ranger, ex-Ozzy Osbourne) na guitarra e David Huff (Giant) na bateria.

Mas o que queríamos mesmo era um novo álbum do Electric Mob, que chega quase três anos depois na forma de “2 Make U Cry & Dance”, a ser disponibilizado nesta sexta-feira (27). A estratégia ligeiramente confusa de divulgação, com um single inicial de tom sóbrio e sério (“Sun is Falling”) seguido de outra faixa mais despojada (“By the Name (Nanana)”) e uma capa peculiar, fez muita gente se questionar com relação ao que viria por aí. Dava para imaginar que seria algo de qualidade, mas com que proposta?

Onde se mexe em time que está ganhando?

Acima de tudo, estamos diante de um material muito bem produzido, não apenas em aspectos técnicos como timbres e mixagem, como também no desenvolvimento das canções em pré-produção. Frequentemente vemos bandas com ótimos músicos que não conseguem dar o melhor em estúdio pela falta de um profissional que possa orientar as gravações – ou por optar pela autoprodução sem que os integrantes estejam devidamente preparados. Tanto em “Discharge” quanto – e especialmente – neste novo trabalho, isso não é problema. Méritos para Amadeus de Marchi, que novamente guiou o processo no Nico’s Studio, e do grupo, que entendeu como aplicar o ditado “em time que está ganhando não se mexe”.

E veja bem: trata-se de saber como adotar a frase pronta como lema. Há mudanças que fazem bem. “2 Make U Cry & Dance” é um exemplo disso, pois seu resultado final foi beneficiado de alguns ajustes em comparação a “Discharge”. Logo nas primeiras músicas se percebe que o segundo disco é um pouco mais direto e acessível que o primeiro. Há maior unidade entre as canções, que invariavelmente apostam mais em refrãos grudentos e menos na experimentação. É como se, enfim, o quarteto tivesse encontrado sua identidade.

“Discharge”, ainda que seja um grande álbum, vez ou outra soa disperso na tentativa de dar protagonismo a certas influências sonoras fora de seu espectro principal. O grupo sempre teve a preocupação de não soar como um mero projeto hard rock revival dos anos 1970 e 80 ao agregar referências de décadas seguintes, do rock alternativo ao metalcore. Contudo, é notório o cuidado extra ao fazer isso em “2 Make U Cry & Dance”, que também tem suas camadas, mas soa mais enxuto e preciso ao dialogar com outros subgêneros.

O choro e a dança, faixa a faixa

A abertura e primeiro single “Sun is Falling” é, curiosamente, um dos poucos momentos ligeiramente experimentais do trabalho. Melancólica e variante entre passagens mais calmas e pesadas, é contornada por teclados que adicionam uma bem-vinda dramaticidade. Toda a performance gira em torno dos vocais de Renan Zonta, que oferece aqui uma de suas melhores interpretações do disco. Só não é o retrato mais preciso do que ouvimos na sequência.

A faixa inaugural chega a ser eclipsada por sua sucessora na tracklist, “Will Shine”. O ritmo de baião na intro, que também inspira um pouco do instrumental na sequência, é tudo o que você menos esperava em um disco de hard rock – e agora provavelmente não viverá sem. O refrão grudento e aberto também ajuda a fazer dessa faixa uma das melhores do material. A título de diversão, leia posteriormente outros reviews já publicados sobre o álbum e divirta-se com os gringos sem saber de onde veio todo esse groove. Que o Electric Mob faça um xote em seu próximo disco.

A dobradinha composta por “It’s Gonna Hurt” e “By the Name (Nanana)” mantém o nível do álbum lá no alto. São faixas irmãs, com forte faro pop especialmente em seus refrãos – a segunda citada recorre até a palminhas, elemento presente no livro dos dez mandamentos de um bom disco de hard rock. “Soul Stealer”, por sua vez, adota roupagem mais contemporânea com seu peso, oriundo em especial da afinação dropada nas cordas, mas sem abdicar do restante da dinâmica natural do grupo.

Primeira balada do material, “4 Letters” soa quase como um desdobramento do que se chamava de “pop rock” no Brasil entre as décadas de 1990 e 2000. É radiofônica e afável, mas não explora a melancolia nem segue por caminhos óbvios. Traz ainda um dos melhores solos de Ben Hur Auwarter, embora seja inegável a sensação de que outros timbres poderiam ser explorados nessa passagem. Em contraponto, a seguinte “Locked n Loaded” nos leva de volta ao padrão mais convencional do hard rock. Não surpreende tanto como o que se ouviu até agora, mas certamente entretém.

“Saddest Funk Ever” é o que o título indica: uma canção de letra não muito contente com alguma influência do funk americano, algo que não se observa tanto após a introdução guiada pelo baixo de Yuri Elero. Ainda que detentora de bons ganchos melódicos em ponte e refrão, soa como uma faixa que poderia ter evoluído para algo mais interessante. “Thy Kingdom Come”, um hard rock feroz e que dialoga com o melhor do sleaze e do Aerosmith setentista, não compartilha da mesma impressão. Do material apresentado até aqui, talvez seja a que melhor vá funcionar em shows.

Próxima do fim, “Love Cage” tem crescimento paulatino. Começa de forma meio óbvia, mas ganha corpo a partir do primeiro refrão e conquista após o segundo, com um dos melhores solos do disco – Auwarter realmente incorporou Slash neste – e passagens raivosas. “Watch Me (I’m Today’s News) conclui a audição em formato difícil de se rotular. Acerta nas influências contemporâneas – com direito a um gutural perdido antes do segundo refrão –, mas ganhou uma característica anticlímax ao ser posicionada como a última do trabalho, além de ser encerrada de repente, sem o desenvolvimento instrumental esperado.

Que o pecado não comprometa

Talvez o único pecado de “2 Make U Cry & Dance”, ao menos sob o ponto de vista mercadológico, esteja na ausência de uma música com a força de “Devil You Know”, faixa responsável por oferecer repercussão mundial ao quarteto. Por outro lado, eles já têm uma canção assim. Este novo álbum oferece mais.

A evolução no comparativo a “Discharge” é nítida, especialmente ao trazer uma sonoridade mais definida. O quarteto não se abstém de explorar diferentes influências do passado e passado, dentro e fora do rock, mas desta vez houve maior critério ao inseri-las. A impressão passada é que os próprios músicos entenderam o potencial de seus trabalhos. É algo para além do underground.

E já que falamos dos integrantes, há de se dizer que os talentos individuais envolvidos são incontestáveis. O grupo demonstra rara sabedoria ao ter consciência de que precisa trabalhar em torno de sua principal arma, a voz de Renan Zonta. No entanto, tudo é feito de modo a não ofuscar os méritos dos demais membros. A cozinha forte e consistente de Yuri Elero e André Leister, com ênfase no segundo citado, mostra-se a base necessária para que tanto Zonta quanto Ben Hur Auwarter, com suas linhas de guitarra efetivas e bem timbradas, tenham os devidos holofotes – ainda que este último apareça de forma bem mais pontual.

No todo, “2 Make U Cry & Dance” é um trabalho mais redondo, direto, equilibrado e até radiofônico que seu antecessor. Uma repercussão menor em comparação a “Discharge” por conta da falta de um single de impacto é para chorar sem dançar.

“2 Make U Cry & Dance” estará disponível nas plataformas digitais a partir desta sexta-feira (27). Clique aqui para fazer o pré-save (antes do lançamento) ou acessar o trabalho (após disponibilizado).

Electric Mob – “2 Make U Cry & Dance”

  1. Sun Is Falling
  2. Will Shine
  3. IT’S GONNA HURT
  4. By The Name (nanana)
  5. Soul Stealer
  6. 4 letters
  7. Locked n Loaded
  8. Saddest Funk Ever
  9. Thy Kingdom Come
  10. Love Cage
  11. WATCH ME (I’m Today’s News)

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Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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