A discografia do Jethro Tull é bastante extensa, especialmente na primeira década e meia de atuação da banda.
Em 2018, a revista Prog pediu que Ian Anderson, único presente em todos os álbuns, fizesse uma retrospectiva, dando suas opiniões sobre cada obra.
Como fica claro – mas às vezes o óbvio precisa ser explicado – os dois mais recentes, “The Zealot Gene” (2022) e “RökFlöte” (2023) não comparece.
A discografia do Jethro Tull, por Ian Anderson
Década de 1960
This Was (1968): “Está tudo no título, não está? Este era o Jethro Tull. Não foi por acaso, porque quando estávamos gravando, a única coisa que eu tinha certeza é que se tivéssemos a sorte de fazer outro álbum, não seria como este: baseado em elementos de blues e na cultura folk negra americana. Não faz parte da minha vida e não poderia continuar fazendo isso – eu pareceria um completo idiota. A capa não tinha logotipo nem nada e as pessoas me diziam que não poderíamos fazer assim, mas fizemos, é claro.”
Stand Up (1969): “A maioridade, de certa forma. O nascimento de músicas mais originais para nós. Foi então que surgiu o que era conhecido como rock progressivo. Se for nesse sentido, é rock e não folk, mas é progressivo porque reflete influências mais ecléticas, juntando coisas, misturando, combinando e sendo mais criativo. Para mim, é um álbum muito importante, fundamental.”
Década de 1970
Benefit (1970): “Um álbum mais sombrio. Você tem que colocar isso no contexto de uma banda que retorna da primeira de três incursões aos EUA. Isso mudou minha mentalidade. Nem tudo é tristeza e desgraça, mas é um álbum um pouco mais excêntrico. Em ‘For Michael Collins, Jeffrey And Me’, mencionamos Michael Collins, o astronauta que ficou preso no módulo de comando e agora sabemos que recebeu instruções para deixar os outros para trás. O homem mais solitário do espaço não recebe glória porque não é o cara que andou na lua.”
Aqualung (1971): “Representa o meu lado cantor/compositor. Grande parte da música saiu de mim dedilhando um violão com o objetivo de mantê-lo assim, em vez de escrever dessa maneira e torná-lo elétrico. Aquele grande riff da faixa-título saiu de uma improvisação acústica – só precisa ter imaginação para ouvir. Você tem que saber que pode cantarolar. Vendeu em todo o mundo. É o álbum que nos fez despontar em países além do Reino Unido e dos EUA.”
Thick As A Brick (1972): “Depois do ‘Aqualung’, senti que precisávamos dar um grande passo em frente. Muitos escritores descreveram ‘Aqualung’ como um álbum conceitual, e eu dizia: ‘Talvez duas ou três músicas estejam na mesma área, mas não é um conceito’. Mas pareceu uma ideia divertida seguir esse caminho pitoniano e tentar usar o humor surreal. Fez sucesso na América, o que foi uma surpresa. Foi a nossa primeira incursão real nesse tipo de apresentação teatral.”
A Passion Play (1973): “O álbum em que demos um ‘passo para longe demais’. Fomos até o Château d’Hérouville, na França, onde Elton John havia gravado. Passamos por momentos difíceis: problemas técnicos, problemas gástricos… só queríamos voltar para casa. Foi o que fizemos e tivemos algumas semanas frenéticas escrevendo um novo disco. Duas músicas foram incluídas no álbum ‘War Child’, uma ou duas se transformaram em algo mais sofisticado, mas nunca foram lançadas. Steve Harris, do Iron Maiden, adora ‘A Passion Play’. Que bom que alguém gostou!”
War Child (1974): “É um álbum ok. O grande destaque foi ‘Bungle In The Jungle’, que é uma reconstrução completa de uma música das fitas do Château. Usava a referência de pessoas se comportando como se fossem animais na selva. Foi escrita para ser um sucesso de rádio e na América acertou em cheio – tocamos nas rádios AM, o que nos mostrou para um público muito amplo e trouxe mais pessoas para os shows. Teve seu momento. Ritchie Blackmore tem uma queda por esse álbum, por algum motivo.”
Minstrel In The Gallery (1975): “Este é esquisito. Foi o último em que Jeffrey Hammond gravou o baixo, então tem uma ressaca negativa, já que sabíamos que ele iria sair. Isso me fez pensar: ‘Talvez eu precise trabalhar sem depender tanto dos outros.’ Comecei a criar sozinho no estúdio, escrevendo e gravando, acompanhado de uma faixa de clique. Então, muitas coisas eram um pouco mais ‘eles e eu’ – um pouco mais insular, musicalmente falando, o que não era bom no espírito de trabalharmos juntos.”
Too Old To Rock’n’Roll: Too Young To Die! (1976): “A faixa-título veio até mim em uma viagem de avião, quando estava em forte turbulência e eu fiquei muito assustado. Era uma peça sobre o tipo de rock’n’roller britânico dos anos 50. Aqueles motociclistas daquela época já estavam chegando aos 40 ou 50 anos. Você poderia zombar, mas há algo bastante nobre, determinado e digno nisso. Só queria explorar essa dicotomia. É melancólico, nostálgico e também um pouco humilhante encontrar esse equilíbrio em uma música.”
Songs From The Wood (1977): “Mais do que qualquer álbum que fizemos, este é aquele em que a banda teve mais a ver com os elementos das músicas. Martin Barre [guitarra] e Dee Palmer [teclado] particularmente trabalharam em um material onde o processo de gravação envolvesse toda a banda. Houve uma ou duas exceções – ‘Jack-In-The-Green’ era eu sozinho em um domingo depois do almoço – mas o resto éramos todos nós. Eu sinto que talvez desde os dias de ‘This Was’ ou ‘Stand Up’ não tínhamos mais uma vibração de banda até aquele momento. Foi bom.”
Heavy Horses (1978): “É preciso lembrar que isso foi na época em que as brasas finais do punk estavam se apagando e havia bandas como The Police e The Stranglers, que eram, coletivamente falando, um bando de velhos hippies. O admirável mundo novo do punk rock talvez tenha se tornado comercializado naquele momento. Mas bandas como essas usaram o estilocomo forma de entrar no mercado, assim como eu fiz com o blues em 1968.
Então, do nosso ponto de vista, não estávamos cientes de que essa nova e intrusiva forma musical tivesse de alguma forma nos afastado dos olhos e da aprovação do público, foi apenas um evento paralelo. Eu realmente não me lembro de ter ficado comovido como criador musical por nenhuma dessas mudanças que estavam acontecendo na música. Eu sabia do que se tratava e gostei bastante de algumas coisas, mas era totalmente diferente do que estava escrevendo. Não queria tentar alcançá-los ou ser influenciado por isso. Ainda estávamos fazendo álbuns do Jethro Tull naquela época.”
Stormwatch (1979): “Havia muito estresse dentro da banda, principalmente por conta da doença de John Glascock [o baixista tinha problemas cardíacos]. Nós o mandamos para casa e dissemos que ele precisava sair da espiral em que estava. Não era apenas a doença, mas seu estilo de vida. Ele subia no palco e seu rosto estava branco como cera, com uma camada de suor. Fiz com que fosse embora para ficar bom e infelizmente ele piorou. Até que recebemos a terrível notícia de seu falecimento. Fizemos tudo o que podíamos para ajudar? Essa é uma pergunta que faremos para sempre.”
Década de 1980
A (1980): “O título era tão simples quanto ‘A for Anderson’ porque era para ser um álbum solo. Eu queria tirar um tempo e pedi a Eddie Jobson para se envolver, então entramos no estúdio. Ouvi essa linha de guitarra nessa parte que escrevi, liguei para Martin Barre e ele acabou ficando até o final. Então a gravadora disse: ‘Parece um novo álbum do Tull’ e me arrependo de ter aceitado isso. Está no limite do nosso repertório: é algo bastante popular.”
The Broadsword And The Beast (1982): “Quando estávamos chegando ao final das sessões, pensei: ‘gastei tanto tempo com esse material, eu realmente gostaria que alguém mixasse.’ Encontramos Paul Samwell-Smith, que conhecíamos do The Yardbirds. Ele apareceu no final e tirou muita pressão de mim. Trabalhamos bem juntos – tínhamos um bom entrosamento e nos recuperávamos muito bem. Eu estava me sentindo muito pressionado nos álbuns anteriores, cuidando de tudo até o fim.”
Under Wraps (1984): “Veio depois do meu álbum solo chamado ‘Walk Into Light’ [1983], onde estava explorando o que era então a nova tecnologia do mundo emergente. Estava tudo passando do analógico para o digital – baterias eletrônicas, sequenciadores muito primitivos e assim por diante. Achei que poderíamos usar isso em um disco do Tull. Tem ótimas músicas e é sem dúvida o único em que eu realmente me esforcei como vocalista. É um ótimo trabalho fora a bateria eletrônica – isso me incomoda até hoje e o público também não gostou. Mas fiquei feliz por tê-lo feito.”
Crest of a Knave (1987): “Rasguei minha garganta durante a turnê do disco anterior. Não conseguia cantar. Pensei que talvez o tempo tivesse acabado e eu tivesse explodido minha voz completamente. Passei um ano sem fazer nada além de consultar especialistas em garganta. Só no verão de 1986 que saímos e fizemos alguns shows, incluindo um em Budapeste, onde escrevi a música de mesmo nome. Na América foi o início da MTV e ‘Steel Monkey’ ganhou bastante destaque. Esse álbum foi bem nos EUA e ganhou o Grammy.”
Rock Island (1989): “O antídoto para o mais alegre ‘Crest Of A Knave’. É principalmente um disco sombrio, de alienação e desolação, exceto pela absurda ‘Kissing Willie’ – uma peça muito lamentável e nada sutil de insinuações atrevidas. Benny Hill ficaria orgulhoso disso. Mas a música ‘Strange Avenues’ ainda é uma das minhas favoritas. ‘Another Christmas Song’ também, que fala de origens e identidade cultural. ‘Todo mundo é de algum lugar, mesmo que você nunca tenha estado lá.’”
Década de 1990
Catfish Rising (1991): “Uma coleção de músicas bastante boa, mas numa época em que Tull não estava exatamente na moda! Algumas pessoas sentiram que ele voltava à nossa base blues – talvez demais para um crítico que se referiu a ele como ‘bacalhau blues’. ‘This Is Not Love’, ‘Still Loving You Tonight’ e ‘Rocks On The Road’ se destacam para mim. Muito disso foi gravado sozinho em meu estúdio com overdubs de Martin Barre e do baixista Dave Pegg. A pior coisa foi a capa. Muito escura! Não há espaço para dar autógrafos com uma caneta preta.”
Roots To Branches (1995): “O último álbum com Dave Pegg. Ele tocou, se não me engano, em apenas três faixas devido à reunião do Fairport Convention – sempre seu primeiro amor – e a tarefa cada vez mais difícil de ser baixista de duas bandas ao mesmo tempo. Todas as músicas ainda funcionam para mim. Contratamos o jazz rocker americano Steve Bailey para tocar no restante. Ele apareceu em uma manhã gelada de janeiro para começar a trabalhar em meu novo estúdio. Atualmente é professor de contrabaixo no Berklee College.”
J.Tull Dot.Com (1999): “Com o advento da internet, pensei que deveríamos ter nosso próprio site. Depois de uma queda de braço legal com o atrevido dono do nome www.jethrotull.com, eu o venci em um tribunal suíço e consegui que fosse liberado para nosso uso. A faixa-título se destaca, junto com ‘Hunt By Numbers’ e ‘Wicked Windows’ – uma referência ao hediondo Heinrich Himmler das especificações duvidosas sob medida. Estive recentemente no museu de Auschwitz, onde estão expostos os óculos de muitos prisioneiros que chegam. Pensei muito nele enquanto caminhava por lá.”
Década de 2000
The Jethro Tull Christmas Album (2003): “Quando a gravadora sugeriu que fizéssemos um álbum natalino, minha reação imediata foi recusar. Mas comecei a me perguntar se haveria uma maneira de fazer algo que não fosse totalmente brega e trivial. Então, criei algumas variações de canções de Natal, olhando para o “outro lado” da data. Alguns materiais do Tull foram regravados porque eu já tinha peças no repertório que abordavam o espírito do inverno. ‘Birthday Card at Christmas’ é especial para mim, pois o aniversário da minha filha é no dia 22 de dezembro e tende a ser encoberto nos dias que antecedem o Natal.”
Jethro Tull no Brasil em 2024
O Jethro Tull volta ao Brasil para shows em 2024. Eis as datas e locais:
- 10/04/2024 Porto Alegre, Auditório Araújo Vianna
- 12/04/2024 Curitiba, Teatro Positivo
- 13/04/2024 São Paulo. Vibra São Paulo
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