Fãs precisaram aguardar por quatro anos até que o Rival Sons lançasse material novo. Uma espera marcada por certa ansiedade, já que “Feral Roots”, lançado em 2019, foi tido por muitos como o melhor disco deste grupo americano de blues/hard rock até então — e um dos melhores do rock na década passada.
Seu sexto trabalho de estúdio atingiu posições de destaque nas paradas do Reino Unido (12º), Países Baixos, Suécia (ambos 4º), Suíça (7º) e Alemanha (8º). Garantiu, ainda, as primeiras indicações da banda ao Grammy: em 2020, disputaram os prêmios de Melhor Álbum de Rock e Melhor Performance de Rock (por “Too Bad”), perdendo respectivamente para Cage the Elephant e Gary Clark Jr.
Com a pandemia, sequer foi possível que Jay Buchanan (voz), Scott Holiday (guitarra), Michael Miley (bateria) e Dave Beste (baixo) concluíssem o ciclo de “Feral Roots” da forma esperada. Ao mesmo tempo, o período de isolamento social fez com que eles tivessem muito a dizer.
Assim nasceram dois álbuns que recompensam bastante a mencionada espera de quatro anos por material inédito. Ambos foram projetados para 2023: “Darkfighter” saiu no último dia 2 de junho, enquanto “Lightbringer” (clique aqui para fazer o pré-save) será disponibilizado nesta sexta-feira (20). Eles receberam edição em CD nacional via Warner / Wikimetal Music.
Em entrevista ao site IgorMiranda.com.br (também disponível em vídeo), Jay Buchanan refletiu sobre como os álbuns se conectam. O vocalista já havia antecipado em material de divulgação que não dava para lançar os discos separadamente por estarem intimamente ligados. Segundo ele, os títulos são bem representativos: “Darkfighter” representa uma luta contra a escuridão, enquanto “Lightbringer” traz uma luz própria onde até então não havia nenhuma.
“‘Darkfighter’ representa uma jornada muito dolorosa difícil. Se você ouvi-lo inteiro, terá a sensação de que alguém está passando por alguma coisa. Por sua vez, ‘Lightbringer’ continua de onde essa jornada terminou. E depois de uma longa jornada, há introspecção, reflexão e crescimento. ‘Lightbringer’ representa esse crescimento. Acredito que as músicas, em sua maioria, ilustram essas definições de uma forma que ‘Darkfighter’ não fez.”
No momento atual da indústria, onde álbuns completos não são exatamente privilegiados — e artistas optam cada vez mais em lançar singles —, surpreendeu a notícia de que o Rival Sons disponibilizaria não apenas um, mas dois discos em um mesmo ano. Buchanan admitiu que ele e seus colegas ficaram receosos em adotar esse formato — “muitas pessoas tinham várias coisas a dizer sobre isso” —, mas declarou que não havia outra forma de liberar esse material para o mundo.
“Certamente não facilitamos para nossa gravadora, mas precisávamos dividir os álbuns para criar uma história ‘contável’. Não iríamos juntar todas as músicas ou deixar algumas de fora. O Rival Sons faz discos completos, não criamos lados B. Não deixamos músicas para trás. Outras bandas sim; nós, não. Se a música merece viver, trabalharemos nela, iremos alimentá-la e nutri-la. Músicas sempre morrem no caminho, mas se ela chega até o fim, é porque ela merecia viver. […] Comercialmente falando, sim, é difícil. Talvez seja caro fazer os dois discos. Mas somos artistas, então, artisticamente, era isso que precisávamos fazer e não me arrependo.”
Menos agudos? Que nada
“Darkfighter”, único dos dois álbuns liberados na época da entrevista, pareceu trazer Jay Buchanan explorando formas diferentes de sua própria voz. Os agudos estavam lá, é claro, mas há canções onde a interpretação é quase toda em tons mais naturais.
Tal pensamento foi compartilhado com Buchanan. O frontman até concordou com a tese de “mostrar lados diferentes de seu canto” após segunda explicação, mas deixou claro de início: alguns de seus vocais mais complicados foram registrados neste álbum.
“‘Darkfighter’ tem vocais mais agudos do que qualquer outro álbum nosso. Confira ‘Mirrors’ no piano. Veja as notas, o quão alto estou cantando a música toda. ‘Guillotine’ é o mais alto que já gravei. ‘Dark Side’ e o final de ‘Rapture’ chegam a lugares muito altos. Foi o álbum mais difícil que gravei vocalmente. Porém, há músicas como ‘Dark Side’, onde o registro é muito baixo. Ou ‘Bright Light’, onde não estou gritando. Ou ‘Rapture’, onde estou apenas cantando uma melodia.”
Jay ainda comentou que, na posição de vocalista, gritar é algo que ele consegue fazer. Não é sua única habilidade.
“Ouvi de algumas pessoas: ‘você não está gritando tanto’. Então eu digo: ‘olhe essa música, ou essa música, ou essa música, está brincando?’. São músicas tão difíceis de cantar, porque são muito altas e há muitos gritos. A impressão pode ser que talvez eu esteja jogando de forma segura porque tenho outras músicas onde apenas canto. Em uma música como ‘Horses Breath’, eu não grito de jeito nenhum. Canto exatamente o mesmo. Mas isso é porque gosto de cantar. Não preciso gritar para transmitir minha mensagem.”
As capas de “Darkfighter” e “Lightbringer”
“Darkfighter” e “Lightbringer” chamam atenção também pelas capas “irmãs”. Um tigre é retratado em ambas as artes, mas em cores e estilos diferentes, sempre buscando refletir o conceito de cada álbum. As artes foram desenvolvidas por Martin Wittfooth, colaborador de longa data do Rival Sons.
Houve zero interferência da banda nas imagens. A primeira, segundo Jay Buchanan, foi produzida totalmente com inteligência artificial. Já a segunda nasceu a partir de pintura à mão.
“Não posso dizer o que as capas significam. Enviamos a música para Martin e ele faz a arte. É isso. Não dizemos a ele o que fazer, pois ele é um mestre no que faz. É como alguém chegar e me dizer como compor uma música. Mas a primeira capa foi produzida usando inteligência artificial, manipulada por Martin. Ele nem precisa fazer isso, mas ele queria ver o que a IA faria se digitasse seu próprio nome, para ver o que a IA produziria de volta. Já no segundo, a ideia era pintar à mão uma resposta ao que esse robô criaria. Foi uma abordagem muito brilhante da parte dele.”
Brasil e rótulo de “banda nova”
Jay Buchanan diz não ver a hora de trazer o Rival Sons de volta ao Brasil. Foram duas passagens: a primeira, em 2015, como parte do festival Monsters of Rock, em São Paulo; a segunda, no ano seguinte, abrindo shows do Black Sabbath em Porto Alegre, Curitiba e Rio de Janeiro, além da capital paulista. Questões logísticas, porém, impediram um retorno desde então.
“Tem sido difícil montar um plano sólido para voltar. Conversamos com nossos agentes o tempo todo: como podemos voltar ao Brasil? Não podemos nos dar ao luxo de ir até aí, pagar nossa equipe e pagar a todos. São todas essas coisas. É o lado logístico. Do ponto de vista romântico, gostaríamos de ir e tocar no Brasil todos os anos, porque o público é incrível. Mas estamos trabalhando nisso.”
Em território nacional, cabe destacar, o Rival Sons é visto como uma banda “nova” — apesar dos quase 15 anos de carreira e, a partir de sexta-feira (20), oito álbuns lançados. Ao refletir sobre como o público — especialmente mais velho — tende a torcer o nariz quando se vê diante de grupos mais jovens, Buchanan foi sincero ao dizer que reage de forma não tão diferente. Em suas palavras, “a maioria das bandas ‘novas’ de rock por aí não são boas”.
“Não me identifico com a maior parte do que está acontecendo no rock, seja o som ou as coisas sobre as quais cantam, mas há algumas bandas por aí que estão fazendo isso de forma correta e honesta. Tentamos fazer nosso melhor. Mesmo assim, alguém vai olhar para o Rival Sons e simplesmente não gostar de nós, não se identificar conosco, e está tudo bem.”
A validação, segundo Jay, vem dos gigantes do rock que os convidam frequentemente para abrir seus shows.
“O que sei é que o Black Sabbath e todas essas bandas mais antigas querem que a gente vá tocar com eles. Eles gostam do que estamos fazendo. Temos reconhecimento não apenas do Sabbath, mas de todos: Rolling Stones, Aerosmith, Deep Purple, Smashing Pumpkins, Queens of the Stone Age… todas querem que a gente toque com eles e nos aprovam. Vamos continuar a fazer as coisas do nosso jeito, mas saber que somos aceitos pelos nossos heróis é o que importa, não o que todo mundo diz. Não importa o que todos aqui ‘embaixo’ (aponta para o chão) estão falando, mas o que os ‘grandes’ (aponta mais alto) têm a dizer.”
Outro rótulo: “classic rock”
Embora tenha explorado influências que vão do blues ao R&B, passando por gospel e soul music, o Rival Sons é, majoritariamente, uma banda de hard rock. À moda antiga, a ponto de ser chamada de “classic rock” — embora tenha surgido já no século 21.
Jay Buchanan refletiu sobre como o rótulo “classic rock” se expandiu, de modo a abranger bandas mais jovens. Para ele, a nomenclatura — que não o incomoda — tem muito mais a ver com “fazer rock da maneira clássica” do que com o ano de surgimento.
“É só rock. Tocamos rock com um monte de nossas próprias influências. Mas entendo quando as pessoas dizem ‘classic rock’: elas querem dizer que é uma banda de rock que está fazendo isso da maneira clássica. Um quarteto, ou às vezes quinteto. Às vezes, temos teclados; às vezes, não. Você tem guitarras, com solos; baterias grandiosas e bombásticas; um vocalista que grita o máximo de seus pulmões. Essa é a fórmula do rock. Entendo o que querem dizer com ‘classic rock’ e não acho que seja algo ruim de se dizer — indica apenas que estamos seguindo a receita dos nossos antepassados, da era de ouro do estilo. É como o Black Crowes, que vem da mesma linhagem.”
Assista à versão em vídeo do bate-papo.
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