Percussionista deixa o Gangrena Gasosa e acusa integrante de importunação sexual

Relato publicado em blog por Ge Vasconcelos descreve incidente sem mencionar nomes; banda se manifestou pelas redes sociais

A percussionista Ge Vasconcelos (Pomba Gira Maria Mulambo) se manifestou online a respeito sua saída do Gangrena Gasosa. O rompimento com a banda carioca de “saravá metal” — nome criado para definir a iniciativa de incorporar elementos de religiões afro-brasileiras à sua música — ocorreu há mais de seis meses, contudo, foi anunciado pelos remanescentes no último dia 26 de janeiro e abordado pela musicista na última sexta-feira (8).

Na postagem via Instagram, Vasconcelos convida o público a ler um texto mais longo, publicado em seu blog Mulambo do Lixo, onde acusa um dos integrantes de importunação sexual. O ex-colega não teve seu nome revelado.

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A situação teria ocorrido após um show realizado pela banda em agosto do ano passado, como parte do festival Kool Metal Fest, no Rio de Janeiro. Outro membro da banda, cuja identidade também não foi divulgada, teria presenciado o ato de importunação e não tomado atitude.

Após a repercussão do caso, o Gangrena Gasosa divulgou nota neste sábado (9), pelas redes sociais, afirmando que não compactua “direta ou indiretamente com qualquer tipo de assédio” e que trabalhará em uma solução “internamente”.

Confira, a seguir, o relato na íntegra de Ge Vasconcelos, além do comunicado do Gangrena Gasosa.

O relato de Ge Vasconcelos

Trazido do blog Mulambo do Lixo. Aviso de gatilho: relato sobre importunação sexual.

“Desde o dia 25 de agosto de 2023 eu me afastei das atividades da banda e nunca mais voltei. Foi após o show da banda no Kool Metal Fest, no Circo Voador, junto com as bandas Velho, Ratos de Porão e Brujeria.

Muita gente nem imagina que eu estou fora há tanto tempo, já que a minha saída foi anunciada meses depois. Só decidi falar sobre o assunto agora, sete meses após a minha última atividade como membro da banda. Muito tempo, né? Motivos? Muitos. Tive que processar bastante coisa, sentimentos escrotos, incluindo a raiva. E eu não queria me manifestar sob influência da raiva. 

A forma como os membros da banda lidaram com o meu afastamento não colaborou pra raiva ir embora, muito pelo contrário, o que fez com que demorasse mais ainda. Tive o meu próprio tempo pra lidar com tudo que aconteceu. Também precisei estar disposta e criar coragem para me expor. Foi complexo chegar até aqui, mas cheguei. Achei que o dia 08 de Março seria uma data com um simbolismo importante pra isso acontecer.

Então vamos lá. Peço, por gentileza, que imaginem a minha saída da banda como um bolo. Um daqueles confeitados, recheados, bonitos, com uma cereja em cima – a famosa ‘cereja do bolo’. A minha saída envolve todos os ingredientes, eletrodomésticos e mão de obra necessários pra preparar esse bolo, mas nesse texto aqui eu falarei apenas sobre a cereja.

SOBRE O SHOW NO KOOL METAL FEST – 25 DE AGOSTO DE 2023
OU MELHOR
SOBRE O PÓS-SHOW

Após esse show eu fui jantar sozinha com uma amiga. Fiquei um tempo só com ela e depois fomos para um bar na Lapa, onde estavam vários conhecidos e alguns integrantes da banda. Não citarei nomes, mas chamarei os integrantes por números. 01, 02, 03 e etc. 

Uma outra amiga que estava no show me mandou mensagem no whatsapp chamando pra ir ao apartamento dela. Ela falou que ainda tinha algumas cervejas em casa e a gente poderia continuar o ‘baile’ por lá. Disse pra eu convidar quem eu quisesse.

‘Escolha umas pessoas legais’

Eu, como uma boa adulta, preferi a festinha no conforto do lar da minha amiga. Sofazinho, chão seco, papel higiênico, banheiro limpo, essas coisas boas de rolé de adulto. Eu topei ir, aguardei a amiga que estava comigo pegar um taxi, já que ela tinha que ir embora, e em seguida chamei algumas pessoas que estavam no bar pra ir comigo.

Olhei para a galera do bar e convidei os integrantes  da banda 01, 02 e a namorada do 02. E convidei também um amigo que estava tentando um Uber há um tempo, sem sucesso. Vou chamá-lo de ‘Amigo’. Pegamos um taxi e fomos todos pra casa da minha amiga.

Saímos de um boteco com banheiro sujo na Lapa, debaixo de chuva, direto pro apartamento da minha amiga. Ambiente gostosinho, sofá, cerveja gelada, vodka, música boa, luzes coloridas, altas vibes. Levei as pessoas pro melhor lugar que se poderia estar naquele momento. Pra vocês terem noção, estava rolando coisas como uma cesta com vários óleos e hidratantes cheirosíssimos, toalhas e bacia com água morna e escalda-pés. 

A vibe boa durou pouco. Infelizmente. Tem homem que não é digno de estar em um ambiente desse na presença de mulheres. Deve imaginar que tá em um filme pornô, sei lá o que passa na mente pornográfica dessa gente.

Em determinado momento o 01 começou o show dele. Passou a mão na bunda da namorada do 02 várias vezes enquanto ela dançava. Ela não teve reação na hora. Não sei o motivo, mas não teve. Pode ter sido pra não estragar o clima, sei lá. Eu estava distraída conversando com o Amigo, não percebi essa movimentação.

Depois o 01 começou com umas ‘brincadeiras’ com a minha amiga, a anfitriã, que envolviam toques no rosto e no corpo dela. Ela pediu pra ele parar e ele continuou mesmo assim. Chegou um momento em que ela estava claramente desconfortável, já desviando dele. Enquanto isso, ele ria do desconforto dela. 

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Nessa hora eu percebi a escrotice que estava acontecendo, e antes que eu tivesse alguma reação a namorada do 02 empurrou o 01 no sofá, meio que jogou ele ao meu lado. Disse pra ele sossegar, porque ele estava doidão e fazendo merda.

Ele ficou quieto por um tempo. Pouco tempo. Em seguida abriu o zíper da calça e começou a se masturbar no sofá. Ao meu lado. 

Isso mesmo, repetindo: o 01, meu ‘companheiro’ de banda, não satisfeito em assediar e tocar sem consentimento a minha amiga e a namorada do 02, começou a se masturbar ao meu lado no sofá. 

Eu não tenho nem ímpeto de colocar essa frase em negrito pra dar mais destaque ao acontecimento. Não precisa, né?

Eu fiquei sem reação, demorei pra acreditar no que estava acontecendo. Dei tela azul mesmo. Travei. A namorada do 02 viu o que o 01 estava fazendo e falou alto algo do tipo: ‘Vem cá, é isso mesmo que tá acontecendo? O 01 tá se masturbando’?

O 02 estava meio offline, meio dormindo, meio acordado. A namorada o chamou e disse o que estava acontecendo: ‘O 01 tá se masturbando!’, cobrando uma atitude do namorado. A resposta foi do 02 foi a seguinte:

‘E sou eu que tenho que resolver isso?’

Repetindo: Essa foi a resposta do 02, meu outro ‘companheiro’ de banda, após ser cobrado pela namorada de ter uma atitude em relação ao que o 01 estava fazendo.

Quando a namorada do 02 foi mais incisiva, ele levantou e começou com grosseria, falando alto no meio da madrugada, fazendo vexame no prédio da minha amiga.

No fim das contas o Amigo e eu tivemos que lidar com tudo sozinhos. Sobre o que foi esse ‘tudo’, deixa quieto. São só complementos de uma noite de merda, ainda dando trabalho pra gente que estava trabalhando (porteiro do prédio, motorista de Uber) e fazendo vergonha no prédio da minha amiga.

E eu que eu levei essa situação pra casa dela. Imagina a minha cara.

Soube recentemente que esse evento está sendo contado por aí como a história da Chapeuzinho Vermelho sem a parte em que o Lobo Mau come a Vovozinha.  Na versão que tá rolando nas mesas de bar, eu fiquei puta só porque o 01 bebeu demais e ficou “chato”.

“Chato”.

Alguns de vocês devem ter ouvido essa versão, né? Inclusive ela chegou até mim através de uma mulher que também estava no bar após o show do Circo Voador. Ela também foi assediada pelo 01 na mesma noite. Na ocasião ela estava com outro integrante da banda, que vou chamar de 03. Ela me contou que o 01 passou a mão nela e disse ‘Se o 03 não quiser, eu quero’.

Nós duas nos aproximamos há pouco tempo e foi ela quem me disse que o 03 contou sobre essa noite na casa da minha amiga, maaaaaas na versão dele o 01 apenas foi ‘chato’. Curiosamente ele ‘esqueceu’ de contar alguns pequenos detalhes, como, por exemplo, que o 01 achou de bom tom se masturbar ao meu lado no sofá.

O 03 foi um dos últimos que eu bloqueei da minha vida. Ele, junto com o 05, ainda se dizia meu ‘amigo’ mesmo depois de eu brigar com ⅗ da banda. Fala algumas coisas boas de mim por aí, faz o papel do Good Cop, essas coisas. E me procurou, mesmo depois de bloqueado. Segundo ele, ‘se humilhando’ pra falar comigo.

Caguei. Caguei quilos. Vejam só que demonstração genuína de amizade: contar por aí uma versão do ocorrido ‘esquecendo’ a parte principal, que é o real motivo da minha indignação. Afinal, ter um membro da banda se masturbando ao meu lado é só um detalhe, né ‘amigo’? Um detalhezinho de nada. Coisinha boba, facilmente ‘esquecível’.

Nada de novo, apenas o pacto masculino seguindo o baile.

Invicto.

Então é isso. Não me estenderei. Por enquanto. Quem não sabia a minha versão, agora sabe. Essa foi a cereja do bolo da minha saída da banda. E vejam só, ela nem foi a pior parte. No próximo texto eu contarei sobre os dias seguintes, sobre como foi a digestão dessa cereja para mim e para os membros e equipe da banda.”

O comunicado do Gangrena Gasosa

Trazido de uma publicação da banda no Instagram.

“Aos nossos fãs e amigos,
Diante das questões apresentadas recentemente achamos importante fazer aqui o nosso pronunciamento sobre o ocorrido.

Antes de mais nada é importante deixar claro que um crime cometido por uma pessoa deve ser tratado como tal e as devidas medidas devem ser tomadas fora da esfera virtual.

Não compactuamos direta ou indiretamente com qualquer tipo de assédio.

A Gangrena é uma banda com mais de 30 anos de estrada representando e exigindo respeito pra cultura do Rock, contribuindo para ascensão de mulheres no cenário majoritariamente dominado por homens.

Problemas existem de todos os lados e vir aqui é um ato de respeito ao nosso público que merece algum tipo de esclarecimento sobre o assunto.

Não passamos pano para assediador e estamos trabalhando nisso, internamente.

A Gangrena hoje envolve mais de 30 pessoas entre homens e mulheres e não se resumirá a ações irresponsáveis.

Reforçamos que em qualquer situação de assédio, denuncie!

Seguimos trabalhando, pedimos a compreensão de todos e até breve.
Laroyê!”

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Igor Miranda
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), com pós-graduação em Jornalismo Digital. Escreve sobre música desde 2007. Além de editar este site, é colaborador da Rolling Stone Brasil. Trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, revista Guitarload, jornal Correio de Uberlândia, entre outros. Instagram, Twitter e Facebook: @igormirandasite.

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