Há 41 anos, em 21 de março de 1983, o Pink Floyd lançava “The Final Cut”, seu 12º disco de estúdio. Marcado pelo clima ruim nas gravações, foi o último da banda com o baixista e vocalista Roger Waters, além de ser o único sem o tecladista Richard Wright.
Confira outros acontecimentos no mundo da música, especialmente no rock, no dia 21 de março de outros anos:
-> Há 47 anos, em 21 de março de 1977, o AC/DC lançava “Let There Be Rock”, seu 4º disco de estúdio. Foi o último com o baixista Mark Evans e o primeiro a ter a versão definitiva do logo na capa. “Whole Lotta Rosie”, “Dog Eat Dog” e a faixa-título são os destaques.
-> Hoje, Roger Hodgson faz 74 anos. O músico, que nasceu em 21 de março de 1950, se consagrou pelo trabalho com o Supertramp. Deixou a banda em 1983, quando se lançou em carreira solo e desacelerou o ritmo das turnês, ficando até 10 anos sem excursionar.
-> Há 12 anos, em 21 de março de 2012, o Unisonic lançava “Unisonic”, seu disco de estreia. Marcou a reunião de Michael Kiske e Kai Hansen após mais de duas décadas, em uma época em que a volta deles ao Helloween era impensável.
-> Há 36 anos, em 21 de março de 1988, o Pixies lançava “Surfer Rosa”, seu disco de estreia. Gravado com técnicas experimentais, fez com que a banda americana ganhasse público na Europa. A música “Gigantic” foi divulgada como single.
-> Há 33 anos, Leo Fender nos deixava. O fundador da Fender morreu em 21 de março de 1991, aos 81 anos, de complicações do Parkinson. Foi o criador de alguns dos modelos mais populares de guitarras, como a Stratocaster e a Telecaster.
-> Há 24 anos, em 21 de março de 2000, o Dio lançava “Magica”, seu 8º disco de estúdio. Conceitual, é baseado em uma história de fantasia escrita por Ronnie James Dio, que planejava concluir o enredo em outros dois trabalhos que nunca foram disponibilizados.
-> Há 24 anos, em 21 de março de 2000, o Pantera lançava “Reinventing the Steel”, seu 9º disco de estúdio. Foi o último álbum divulgado pela banda, que acabou em 2003. “Revolution is My Name”, “Goddamn Electric” e “I’ll Cast a Shadow” foram os singles.
-> Há 35 anos, em 21 de março de 1989, Madonna lançava “Like a Prayer”, seu 6º disco de estúdio. Priorizando o som de instrumentos ao vivo, o álbum acrescenta mais versatilidade ao som típico da cantora. “Express Yourself” e a faixa-título foram os principais singles.
-> Há 30 anos, em 21 de março de 1994, o Yes lançava “Talk”, seu 14º disco de estúdio. Inicialmente, contaria com Rick Wakeman, mas o tecladista acabou não se envolvendo. As músicas “Walls”, “The Calling” e “State of Play” foram promovidas como singles.
-> Há 29 anos, em 21 de março de 1995, o Death lançava “Symbolic”, seu 6º disco de estúdio. Com abordagem mais melódica, é o único com o guitarrista Bobby Koelble e com o baixista Kelly Conlon, além de ser o último com o baterista Gene Hoglan.
-> Há 75 anos, em 21 de março de 1949, nascia Eddie Money. O cantor morreu em 13 de setembro de 2019, aos 70 anos, de câncer no esôfago. Um dos maiores hitmakers das décadas de 70 e 80, chegou a ser indicado ao Grammy pelo sucesso “Take Me Home Tonight”.
-> Há 41 anos, em 21 de março de 1983, o Saxon lançava “Power & The Glory”, seu 5º disco de estúdio. Marcou a estreia do baterista Nigel Glockler. Traz destaques como a faixa-título e “Nightmare”, que foram divulgadas como singles.
-> Há 10 anos, em 21 de março de 2014, o Asia lançava “Gravitas”, seu 13º disco de estúdio. Foi o último com o baixista e vocalista John Wetton, além de ser o único com o guitarrista Sam Coulson. A música “Valkyrie” ganhou um clipe e é um dos destaques do álbum.
-> Há 24 anos, em 21 de março de 2000, o Mr. Big lançava “Get Over It”, seu 5º disco de estúdio. Foi o primeiro dos dois álbuns com o guitarrista Richie Kotzen, que também dividia vocais com Eric Martin. “Static” e “Superfantastic” são alguns dos destaques.
-> Há 29 anos, Steve Vai lançava o EP “Alien Love Secrets”. Antecipou algumas composições do mesmo período do álbum “Fire Garden” (1996). “Bad Horsie”, “Juice”, “Ya-Yo Gakk” e “Tender Surrender” estão entre os destaques.
-> Hoje, Keith Palmer faz 57 anos. Mais conhecido como Maxim, o músico que nasceu em 21 de março de 1967 foi um dos vocalistas do Prodigy, sendo um dos responsáveis pela pegada mais hip hop no som do grupo. Também trabalhou em carreira solo.
-> Há 16 anos, em 21 de março de 2008, o Firewind lançava o álbum “The Premonition”.
-> Há 33 anos, em 21 de março de 1991, o Praying Mantis lançava o álbum “Predator in Disguise”.
A história de “The Final Cut”, último álbum do Pink Floyd com Roger Waters
Em 1983, o Pink Floyd poderia estar comemorando o 10º aniversário de “The Dark Side of The Moon”, sua obra-prima; ainda colhendo os frutos do sucesso retumbante de “The Wall”, que acabara de ganhar uma versão cinematográfica no ano anterior; ou simplesmente vivendo a glória de ser a única banda entre os dinossauros do rock progressivo a se manter relevante na nova década sem mudanças drásticas em seu som.
No entanto, o prisma da época também oferecia feixes luminosos que apontavam para o lado obscuro da conjuntura particular do grupo. Pela primeira vez desde a saída de Syd Barrett em 1968, o Pink Floyd lidava com uma baixa na formação. O posto de tecladista ficou vago após Richard Wright ser sacado pelo baixista e vocalista Roger Waters em 1981. Internamente, Waters e o guitarrista/vocalista David Gilmour já viviam às turras, e o baterista Nick Mason se mostrava cada vez mais alijado do processo.
Para piorar o cenário, Roger encasquetou que o próximo álbum deveria partir de onde “The Wall” parou, aproveitando músicas já compostas anteriormente. E que traria um conceito envolvendo Guerra das Malvinas e a morte de seu pai.
Ou seja: seria, na visão dos demais integrantes, obsessivamente político e um tanto quanto individualista, pois continuaria a abordar traumas pessoais de sua infância. E o mais grave: cometeria o erro de requentar sobras do antecessor.
Ao jornalista e escritor britânico Mark Blake, autor do livro “Nos Bastidores do Pink Floyd” (2008), Gilmour ironizou:
“Se essas músicas não eram boas o suficiente para “The Wall”, por que elas seriam boas o suficiente agora?”
E acrescentou a David Fricke, da Rolling Stone, sobre essa fase da banda:
“Muito miserável. Até Roger diz que foi um período miserável – e foi ele quem o tornou assim, pelo menos na minha opinião.”
É nesse contexto que o Pink Floyd chega a “The Final Cut”, seu 12º álbum de estúdio. Lançado em 21 de março de 1983, foi o último com Roger Waters, o único sem Richard Wright e o que menos vendeu desde “Meddle” (1971). Um disco nascido sob o signo do fracasso – sequer houve turnê de divulgação – e que levou à ruptura definitiva no núcleo criativo da banda.
O sonho do pós-guerra
Roger Waters perdeu o pai pouco depois de nascer, com apenas cinco meses de idade. Eric Fletcher Waters morreu a serviço do exército britânico na Batalha de Anzio, em janeiro de 1944, durante a Segunda Guerra Mundial.
No coração e na mente de Waters, o pai e demais soldados mortos em combate aos regimes totalitários do nazismo e do fascismo sacrificaram suas vidas em prol de um sonho: o de erigir um mundo de paz ao fim da guerra, em que a nova ordem mundial seria a harmonia entre as nações. A esse conceito, ele deu o nome de “the post war dream” (o sonho do pós-guerra).
Quando, em 1982, o Reino Unido, à época sob comando da primeira-ministra Margareth Thatcher, bombardeia uma navio da marinha da Argentina e dá início à Guerra das Malvinas, Waters sente como se seu pai, os militares que tombaram na Segunda Guerra Mundial e o povo britânico tivessem sido todos traídos.
Bingo! Estava pronto o roteiro de “The Final Cut”. O que antes fora imaginado como uma espécie de continuação de “The Wall” – inclusive, o nome inicial seria “Spare Bricks” (tijolos sobressalentes) – agora ganhava vida própria na forma de um disco conceitual baseado na Guerra das Malvinas.
Em “Nos Bastidores do Pink Floyd”, de Mark Blake, Waters explica:
“O ‘The Final Cut’ foi sobre como, com a introdução do estado de bem-estar social, sentimos que estávamos avançando para algo parecido com um país liberal em que todos cuidaríamos uns dos outros. Mas eu vi tudo isso ser eliminado, eu vi o retorno a uma sociedade quase dickensiana (de um grau de pobreza extrema) com Margareth Thatcher. Eu sentia que o governo britânico deveria ter buscado vias diplomáticas.”
O termo “The Post War Dream” também chegou a ser cogitado para o nome do álbum, mas acabou batizando somente a faixa que abre o trabalho. Nela, Waters se dirige diretamente a sua antagonista, “Maggie” (Margareth Thatcher): “Foi para isso que o papai morreu?”, “O que fizemos com a Inglaterra?”, “O que aconteceu com o sonho do pós-guerra?”, “Maggie, o que nós fizemos?”.
Conflito interno
Enquanto Reino Unido e Argentina mediam forças no Atlântico Sul, no campo de batalha do Pink Floyd o embate era entre Roger Waters e David Gilmour. E o que se viu prevalecer foi um massacre de autoridade do baixista sobre o guitarrista.
Roger Waters assina sozinho todas as 13 canções de “The Final Cut”. Para quem nunca foi muito afeito a cantar, ele surpreende fazendo o vocal principal em 12 delas – apenas em “Not Now John” divide a tarefa com David Gilmour.
Apesar do novo conceito surgido a partir da Guerra das Malvinas, musicalmente Waters não abriu mão de aproveitar composições remanescentes da época de “The Wall”. Ele desengavetou pelo menos seis delas: “Your Possible Pasts”, “One of the Few”, “The Hero’s Return”, “The Fletcher Memorial Home”, a faixa-título e, especialmente, “When the Tigers Broke Free”, que demanda explicação.
Composta em 1979, ela já havia sido recusada pelos outros integrantes, que alegaram ser uma canção pessoal demais. A letra narra exatamente a história da morte do pai de Waters. “When the Tigers Broke Free” foi vetada novamente em um primeiro momento e passou a constar no tracklist de “The Final Cut” somente a partir da reedição de 2004 do álbum.
Em 2000, David Gilmour negou que o motivo do conflito fosse necessariamente o conteúdo lírico, mas a qualidade das canções.
“Havia todo tipo de discussão sobre assuntos políticos, e eu não partilhava das visões dele. Mas nunca, jamais, quis ficar no caminho dele de expressar a história de ‘The Final Cut’. Eu simplesmente não achava que algumas das músicas estavam à altura.”
Sobre sua completa ausência no processo de composição, Gilmour admite que não se esforçou tanto para colaborar. Em “Nos Bastidores do Pink Floyd”, o guitarrista conta ao jornalista e escritor Mark Blake que tem culpa no cartório, mas volta a atacar com fogo amigo o material apresentado por Waters:
“Eu certamente sou culpado por ter sido preguiçoso. Havia momentos em que Roger dizia: ‘bem, o que você trouxe?’, e eu dizia: ‘então, eu não tenho nada; preciso de um tempo para gravar algumas ideias’. Existiu tudo isso e, anos depois, você olha para trás e diz: ‘é, ele tinha razão’. Mas ele não estava certo em querer colocar algumas músicas idiotas em ‘The Final Cut’.”
A falta de sintonia da dupla criativa do Floyd gerou, inevitavelmente, situações tragicômicas em que astros não se comunicam em estúdio. Waters gravava suas partes com o engenheiro de som Andy Canelle. Gilmour trabalhava exclusivamente com o produtor James Guthrie, que depois tinha a missão de juntar o material.
A contribuição do baterista Nick Mason foi ínfima, muitas vezes se resumindo apenas em tocar o que lhe era ordenado. Ray Cooper, que já trabalhara com Elton John, Paul McCartney, Eric Clapton e Rolling Stones, acrescentou percussões.
A tarefa de gravar os teclados ficou com Michael Kamen, maestro e compositor que já havia participado de “The Wall” e famoso pela parceria orquestral com o Metallica na década de 1990. No fim das contas, Gilmour foi excluído dos créditos de produção.
O corte final
Daryl Easlea, jornalista da revista especializada Prog, escreveu um longo artigo sobre “The Final Cut” em 2022. Ele diz que “o álbum tem poucos ganchos marcantes, nenhum momento comercial de destaque e nada dele foi tocado pelo Floyd ao vivo”. E acrescenta: “inicialmente, isso não freou o rolo compressor do Pink Floyd […], mas logo esse rolo compressor virou apenas um canivete”.
Difícil discordar de que esse seja realmente o lugar de “The Final Cut” na vasta discografia do Pink Floyd, apesar de, pelo menos, “Not Now John” e “The Fletcher Memorial Home” serem, sim, momentos de bastante relevo no cancioneiro da banda.
Porém, o próprio Roger Waters reconhece que a obra tem sérios problemas. Acusado muitas vezes de ser quase um disco solo do baixista, o álbum não viu a cor da estrada e dificilmente aparece entre os favoritos dos fãs.
Em 1984, sem realizarem um único show sequer para divulgá-lo, os integrantes já estavam ocupados com suas respectivas carreiras solo. No ano seguinte, Waters jogou a toalha e saiu do Pink Floyd para nunca mais voltar.
Em entrevista a Chris Salewicz em 1987, ele fez um balanço:
“O ‘The Final Cut’ foi absolutamente um tormento de se fazer, embora eu o tenha ouvido ultimamente e goste muito dele. Mas eu não gosto do modo que cantei nele. Você pode ouvir uma tensão louca correndo por toda parte. Como se eu estivesse tentando expressar algo, mas sendo impedido porque estava muito tenso. Foi uma época horrível. Estávamos todos brigando como cães e gatos. Finalmente estávamos percebendo – ou aceitando, se preferir – que não havia mais uma banda.
Ele vendeu três milhões de cópias (até 1987), o que não é muito para o Pink Floyd. Como consequência, David Gilmour saiu dizendo: ‘aí está, eu sabia que ele (Waters) estava errado o tempo todo’. Mas é absolutamente ridículo julgar um disco apenas pelas vendas. (…) De qualquer forma, um dia eu estava em uma quitanda e uma mulher de uns 40 anos veio até mim. Ela disse que achou o disco o mais comovente que já tinha ouvido. Seu pai também havia sido morto na Segunda Guerra Mundial. Eu voltei para o carro e dirigi para casa pensando: ‘isso já é bom o bastante’.”
Por fim, “The Final Cut” levou esse nome em referência à famosa tragédia “Júlio César”, de William Shakespeare. Na peça, a traição de Brutus, que assassinou César a facadas, é descrita como “the most unkindest cut of all” (o corte mais indelicado de todos). Uma clara metáfora a como Roger Waters se sentia.
Traído por seu próprio país, por sua própria banda.
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