Entrevista: Chris Slade fala sobre AC/DC, David Gilmour, Jimmy Page e novo álbum

Baterista de 77 anos segue na ativa e disponibiliza primeiro disco de sua banda atual, Chris Slade Timeline

A bateria não é apenas uma profissão para Chris Slade, mas uma paixão que o impulsiona a continuar tocando até hoje. Em seis décadas profissionalmente dedicadas ao instrumento, teve a oportunidade de conhecer e aprender com Sandy Nelson e Buddy Rich, e por pouco não se tornou baterista de Elvis Presley; uma oportunidade que, embora não tenha se concretizado, demonstra o reconhecimento de seu talento pelo Rei do Rock.

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Em sua longa e bem-sucedida carreira, porém, Slade colaborou com diversos outros artistas renomados em estúdio e nos palcos, como se recorda nesta entrevista exclusiva. Em meio à divulgação de “Timescape”, o primeiro álbum de seu grupo Chris Slade Timeline, o músico de 77 anos conversou com o site IgorMiranda.com.br sobre sua jornada repleta de experiências únicas — que envolveram trabalhos com AC/DC, David Gilmour, Jimmy Page e vários outros ícones — e o movimentado presente.

Confira abaixo!

Entrevista com Chris Slade

Transformando visões: o novo capítulo

Quando formou o Timeline em 2012, Chris Slade tinha como objetivo celebrar seus 50 anos como baterista profissional. Extensas turnês pelo Reino Unido e Europa se seguiram, encantando plateias com sucessos de AC/DC a Led Zeppelin, além de algumas músicas próprias.

Mais de uma década depois, eis que o Timeline finalmente faz sua estreia em disco. Quando do anúncio do duplo “Timescape”, Slade brincou:

“A banda sempre quis trabalhar em material autoral, mas sempre faltava tempo. Agora, com a pandemia, o que não falta é tempo!”

Segundo o press release, uma das características marcantes de “Timescape” é a sua “visão orquestral progressiva”. Slade revela ao site que sempre teve o desejo de combinar elementos orquestrais com o rock, e em seu novo álbum, lançado no dia 19 de julho pela BraveWords Records, essa visão ganha vida. Ele conta que a colaboração com o tecladista Michael Clark foi fundamental para transformar essa ideia em realidade, com a criação de arranjos que mesclam elementos clássicos e modernos de forma harmoniosa.

A banda que o acompanha nesta jornada — os vocalistas Paul “Bun” Davis e Steve Glasscock, o guitarrista James Cornford, o baixista Andy Crosby e o supracitado Clark — é elogiada por sua versatilidade e profissionalismo. Slade afirma:

“Esses caras são músicos tremendos e capazes de tocar qualquer coisa. Eu conhecia eles antes de se tornarem minha banda e sabia que eles poderiam se adaptar a diferentes estilos musicais, transitando com facilidade entre o som elementar do rock e composições mais progressivas e complexas.”

A fatia autoral (CD1) traz como destaques “We Will Survive”, cujo clipe foi dirigido por Davis, e “Time Flies”, na qual o baterista, pela primeira vez, assume os vocais principais. “Nunca cantei solo antes na minha vida. Posso ser afinado, mas não tenho voz”, reconhece, aos risos.

Ao escolher as músicas que comporiam o repertório de covers (CD2), Chris Slade buscou, acima de tudo, “entreter o público, para ser honesto”. A inclusão de clássicos de sua carreira, como “Blinded by the Light” (Manfred Mann’s Earth Band) e “Thunderstruck” (AC/DC), atende a esse propósito e, ao mesmo tempo, serve como um tributo a essas canções icônicas.

Quando perguntado sobre os planos para promover o novo álbum, ele responde:

“Se eu planejo fazer uma turnê? Mas é claro! Veja bem, nós estamos na estrada há mais de 10 anos. Eu só pararia [com as turnês] se não pudesse tocar com tanto poder quanto tocava no passado.”

O itinerário prevê datas na Itália e na Alemanha. Por enquanto, nada de Brasil.

Entre lendas: Gilmour, Page e além

Chris Slade começou cedo, aos 16 anos, na banda de apoio de um jovem Tom Jones — na época, Tommy Scott —, a quem elogia por provavelmente ter a melhor voz natural já ouvida, “porque nunca fez uma aula de canto”. Em seguida, cofundou a Manfred Mann’s Earth Band, destacando a versatilidade do grupo com o qual gravou oito álbuns de estúdio entre 1972 e 1978.

Ao discutir sua breve passagem pelo Uriah Heep, Slade defende o álbum “Conquest” (1980), que é visto por alguns fãs, e até pelo guitarrista Mick Box, como o mais fraco da banda. Ele ressalta que o disco representa uma nova fase para o grupo, com a entrada do galês John Sloman nos vocais e a adoção de uma sonoridade mais comercial.

“Era uma banda completamente diferente, e Sloman era um cantor e compositor completamente diferente. Acho [o disco] muito bom. Diga a ele [Box] que ele não sabe de nada! [Risos.]”

A experiência de trabalhar com David Gilmour na turnê de “About Face” (1984) foi marcante para Slade. O baterista admira a inteligência musical — “Ele é um cara que realmente pensa sobre sua música” — e a generosidade do guitarrista do Pink Floyd, exemplificada na lembrança de que, em meados do giro, Gilmour “vendeu uma propriedade em Londres por dois milhões de libras e doou para os sem-teto”.

Leia também:  Ouça David Gilmour cantar e tocar “Time” e “Breathe” em ensaio de turnê

No mesmo dia em que aceitou o convite para se juntar a Gilmour, Slade recebeu outro telefonema, do qual se recorda muito bem:

“Eu tinha ido a um pub para almoçar e tomei algumas cervejas. Já tinha dito ‘sim’ para Gilmour. Atendi o telefone. ‘Olá, Jimmy Page aqui.’ Pensei que era trote. Só que não, não era; era realmente Jimmy Page. ‘Escuta, Paul Rodgers e eu estamos montando uma banda e gostaríamos que você fosse o baterista.’ Com o coração na mão, respondi que havia me comprometido com a turnê de Gilmour. ‘Ah, sem problemas, podemos esperar.’ Eu mal pude acreditar que estava ouvindo isso. E eles esperaram mesmo, quase um ano! Fiquei na estrada com Gilmour por nove, dez meses.”

A oportunidade de tocar com o guitarrista do Led Zeppelin e o vocalista de Free e Bad Company no The Firm foi um sonho realizado para Chris Slade. Perguntado sobre o processo criativo do supergrupo completado pelo baixista Tony Franklin e sobre a unânime genialidade de Page, ele tem dificuldade em encontrar as palavras. Hesitante, afirma apenas que Jimmy era “um ótimo músico e um cara legal”.

O detentor de tal distinção é o verdadeiro cérebro por trás do som característico da empreitada seguinte do baterista.

AC/DC, Axl Rose e o gênio Malcolm Young

Era novembro de 1989 quando Chris Slade foi recrutado para substituir o recém-saído Simon Wright no AC/DC. A ideia era que o baterista, que vinha tocando com Gary Moore, apenas quebrasse um galho, gravando o álbum The Razors Edge (1990). Durante as gravações no Little Mountain Sound, em Vancouver, Canadá, os irmãos Angus e Malcolm Young fizeram o convite para que ele assumisse o posto em definitivo.

No AC/DC, Slade conviveu e colaborou com aquele que considera o maior gênio da composição no rock. Ele estufa o peito para falar:

“Malcolm era um gênio. Foi o melhor guitarrista base que eu já ouvi e provavelmente ouvirei. Estava sempre no tempo certo. Era uma seção rítmica em forma de gente. Obviamente, faz muita falta. E o AC/DC era sua banda, sabe? Não era a banda de Angus, era a banda de Malcolm. Era ele quem tomava as decisões sobre direcionamento visual, letras e músicas. Embora [Angus e Malcolm] escrevessem juntos, eu considero Malcolm o verdadeiro gênio. Em outras palavras, ele era único.”

Ao comentar sobre “The Razors Edge”, o baterista ressalta a importância do single “Thunderstruck” e o processo de gravação meticuloso da banda. Ele revela que a música carro-chefe foi gravada e regravada ao vivo no estúdio diversas vezes ao longo de três diasaté que o resultado final fosse considerado perfeito. “Era assim que eles trabalhavam: ouviam cada tomada até decidirem qual era a melhor”, explica.

Sua saída da banda é abordada com honestidade. Ele conta que depois de trabalhar nas demos para o álbum seguinte, “Ballbreaker” (1995), recebeu uma ligação de Malcolm na qual foi informado de que o AC/DC iria tentar uma reunião com o antigo baterista Phil Rudd. Sua resposta foi um simples “beleza, estou fora”. Embora se coloque no lugar do guitarrista — “Eu mesmo já fiz isso [demitir algum colega], então entendi em que posição incômoda ele estava” —, Slade não aceitou muito amigavelmente a dispensa:

“Por que mexer em time que está ganhando? É assim que eu penso. E eu achava que a banda realmente funcionava bem. Passei três meses fazendo as demos com Angus e Malcolm, só os dois e eu. E então Phil teve que aprender minha parte de bateria. Sei que ele fez isso porque quando fui visitar Cliff [Williams] e Brian [Johnson]em Londres, eu podia ouvir minhas demos para ‘Ballbreaker’ sendo tocadas em algum lugar. Cliff explicou: ‘Phil está hospedado no apartamento de cima aprendendo as músicas’.”

Se o telefone de Chris Slade tocasse novamente…

Chris Slade, que voltou para o AC/DC em 2015, admite ter ficado surpreso com a decisão de trazer Axl Rose para substituir Johnson, à época obrigado a se afastar dos palcos sob o risco de surdez permanente. Todavia, elogia o profissionalismo e a dedicação do vocalista do Guns N’ Roses, a quem chama de “sempre pontual e muito engraçado”, além de o responsável pelo resgate de duas canções da fase Bon Scott há muito esquecidas pela banda: “Touch Too Much” e “If You Want Blood (You’ve Got It)”.

Preterido novamente em favor de Rudd em 2020, Slade não guarda ressentimentos. Ansioso para ver a banda em ação na presente turnê de “Power Up” (2020), ressalta que a amizade com Angus e Brian permanece e que considera o atual baterista Matt Laug, a quem conhece de longa data, não só um ótimo músico, mas “um dos maiores bateristas que já vi”.

Mas e caso Laug tenha algum problema e o telefone tocasse uma terceira vez, qual seria a resposta?

“‘Vamos nessa!’, é óbvio.”

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Marcelo Vieira
Marcelo Vieirahttp://www.marcelovieiramusic.com.br
Marcelo Vieira é jornalista graduado pelas Faculdades Integradas Hélio Alonso (FACHA), com especialização em Produção Editorial pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Há mais de dez anos atua no mercado editorial como editor de livros e tradutor freelancer. Escreve sobre música desde 2006, com passagens por veículos como Collector's Room, Metal Na Lata e Rock Brigade Magazine, para os quais realizou entrevistas com artistas nacionais e internacionais, cobriu shows e festivais, e resenhou centenas de álbuns, tanto clássicos como lançamentos, do rock e do metal.

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