Sepultura se despede do Rio com show que revisita suas glórias

Cada vez mais próxima de seu prometido fim, banda celebrou seus 40 anos em duas horas na Farmasi Arena

O que parecia distante há alguns anos, se tornou uma triste realidade: o Sepultura, maior banda brasileira de rock — não apenas de metal — em termos mundiais, está se aposentando. A turnê de despedida, apropriadamente intitulada “Celebrating Life Through Death”, tem 2026 como data limite.

Demorou alguns meses até que o quarteto formado por Derrick Green (voz), Andreas Kisser (guitarra), Paulo Xisto Jr (baixo) e Greyson Nekrutman (bateria) confirmasse apresentação no Rio de Janeiro. Mas aconteceu.

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Foto: Paty Sigiliano @paty_sigilianophotos

A Farmasi Arena, antes conhecida como Jeunesse Arena, os recebeu no último sábado (31) em uma noite de bom público, apesar dos vários espaços vazios, especialmente na arquibancada. O Qualistage, com metade da capacidade do público (8.450), talvez fosse uma escolha mais apropriada para a realização do evento.

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Capricho sonoro e também visual

O grupo subiu ao palco com 30 minutos de atraso, após o som mecânico tocar “War Pigs” (Black Sabbath) e “Polícia” (Titãs). Entraram a mil com “Refuse/Resist” e se não surpreenderam pela sempre constante competência musical, certamente chamaram atenção pela incrível produção visual. Eram seis telões de diferentes tamanhos, com destaque para o principal, que exibiu temas aparentemente criados por inteligência artificial e recordou momentos da carreira do grupo — com direito até a imagens dos ex-integrantes Max e Iggor Cavalera. Ao menos na despedida houve um capricho nesse sentido para fazer jus a uma trajetória tão vitoriosa.

Foto: Paty Sigiliano @paty_sigilianophotos

A introdução de “Territory” foi a confirmação que Nekrutman foi a escolha certa para o lugar do demissionário Eloy Casagrande, atualmente no Slipknot. Ainda que não tenha o mesmo nível de estamina de seu antecessor, o americano ex-Suicidal Tendencies mostrou muita segurança e solidez para o Sepultura. “Propaganda”, outra de “Chaos A.D.” (1993), fecha a trinca inicial de músicas do quinto álbum da banda com bastante vigor.

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“Phantom Self” foi a primeira da era Green a ser executada. Ao vivo, mantém as partes orquestradas originalmente por meio de VS (Virtual Sound) — o que não é demérito algum; pelo contrário, engrandece a execução.

Passados distante e recente

“Boa noite, temos muitas músicas para tocar essa noite. Quem de vocês tem o álbum ‘Roots’? Essa música se chama ‘Dusted’.” Com essas palavras de Derrick, foi introduzida a mencionada canção — que oferece as melhores credenciais das qualidades de Paulo Xisto Jr.

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Por falar no disco de 1996, este momento do set contou com mais duas faixas desse período: “Atittude”, que teve seu videoclipe veiculado em exaustão na saudosa MTV Brasil, e a rapidíssima “Spit”, interrompida no começo após algum problema técnico na guitarra de Kisser. Do nada, Greyson puxou uma levada jazzística e foi muito engraçado vê-lo olhar para Paulo e fazer sinais para o baixista acompanhá-lo, o que infelizmente não aconteceu.

Do pouco reconhecido “Kairos” (2011), tivemos a faixa-título. Apesar do setlist ter na sua maioria músicas da fase Max Cavalera (1984 a 1996), a recepção do material recente foi positiva, além de mostrar o grande frontman que Derrick se tornou ao longo de anos de estrada. Se no começo era olhado com desconfiança, o americano hoje desfila segurança no palco e parece estar bem mais relaxado do que quando entrou no Sepultura, em 1997.

Andreas pegou o microfone para agradecer a presença de todos e se desculpar por não tocar há bastante tempo no Rio de Janeiro. Mas espere aí… o Sepultura tocou duas vezes na cidade em 2022: no Circo Voador e no festival Rock in Rio. A emoção parece ter falado mais alto no “Alemão”, que aproveitou a ocasião para apresentar o mais novo membro da família: o agora “vascaíno” Greyson, com direito a um agradecimento ao Clube de Regatas Vasco da Gama por receber o baterista em uma visita antes do show. Foi a deixa para “Means to an End” com direito a um solo muito inspirado por parte do guitarrista.

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“Convicted in Life” e “Guardians of the Earth” foram recebidas com entusiasmo, principalmente a última, durante a qual foi evidenciado o talento no violão de Kisser — muito mais do que uma máquina de power chords, riffs e solos. Após uma sequência com “Mind War”, “False” e “Choke”, era momento de volta ao tempo com a clássica “Escape to the Void”, do seminal “Schizophrenia” (1987), responsável por oferecer vibração extra especialmente aos old schoolers presentes na Farmasi Arena. Contrariando eventuais expectativas, Nekrutman não teve dificuldade no material mais extremo do grupo e mostrou habilidade de acordo com o cargo que lhe foi confiado.

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Foto: Paty Sigiliano @paty_sigilianophotos

Convidados, (suposto) improviso e catarse

Com a presença de amigos e convidados no palco — incluindo o ex-baterista dos Raimundos, Fred Castro —, a instrumental acústica “Kaiowas” trouxe calmaria em meio à pancadaria sonora. Foi um momento intenso e emocionante, tal qual a execução de “Dead Embryonic Cells”, outra música que transcendeu o nicho do metal extremo e levou o som do Sepultura a vários lares através da já citada MTV Brasil no início dos anos 1990.

“Biotech is Godzilla” veio e foi tão rápida como uma música dos primeiros discos do Napalm Death, enquanto a épica “Agony of Defeat” reforçou como Derrick Green é um dos grandes vocalistas da cena mais extrema — se é que pode ser chamada desse jeito. Interpretação categórica. Chega, então, o momento de uma surpresa: “Orgasmatron”, cover do Motörhead, tocada em partes pela primeira vez na tour e aparentemente improvisada, vide a troca de olhares contínua ao longo da execução. Colada nela tivemos “Troops of Doom”, do primeiro álbum completo do grupo, “Morbid Visions” (1986), e um elevado número de pessoas “tocando” air guitars.

Foto: Paty Sigiliano @paty_sigilianophotos

A dobradinha “Inner Self” e “Arise” encerraram a parte regular do set e deixaram o nível altíssimo para o bis. “Ratamahatta”, primeira executada nesta etapa, teve participações percussivas de Fred Castro — o “Andreas Kisser”, digo, o “arroz de festa” da noite — e Chico Brown, filho de um dos compositores da canção, Carlinhos Brown. Os dois continuaram quando “Roots Bloody Roots” fechou e promoveu uma verdadeira catarse. Sempre que este clássico é tocado, a vibração é diferente. Por, provavelmente, ser o momento derradeiro do Sepultura nos palcos cariocas, a emoção tomou conta do lugar até a última nota dada pela banda.

A sensação, acima de tudo, precisa ser de dever cumprido. Quarenta anos não são quarenta dias. O Sepultura pareceu ciente disso ao agradecer ao público e se despedir, ao que tudo indica, pela última vez dos fãs do Rio. Obrigado por tanto.

*Mais fotos no fim da página.

Foto: Paty Sigiliano @paty_sigilianophotos

Sepultura — ao vivo no Rio de Janeiro

  • Local: Farmasi Arena
  • Data: 31 de agosto de 2024
  • Turnê: Celebrating Life Through Death
  • Produção: 30e

Repertório:

  1. Refuse/Resist
  2. Territory
  3. Propaganda
  4. Phantom Self
  5. Dusted
  6. Attitude
  7. Spit
  8. Kairos
  9. Means to an End
  10. Convicted in Life
  11. Guardians of Earth
  12. Mind War
  13. False
  14. Choke
  15. Escape to the Void
  16. Kaiowas
  17. Dead Embryonic Cells
  18. Biotech is Godzilla
  19. Agony of Defeat
  20. Orgasmatron (cover de Motörhead)
  21. Troops of Doom
  22. Inner Self
  23. Arise

Bis:

  1. Ratamahatta
  2. Roots Bloody Roots
Foto: Paty Sigiliano @paty_sigilianophotos
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Tarcísio Chagas
Tarcísio Chagas é formado em produção fonográfica pela faculdade Estácio de Sá e trabalhou nos sites Confere Rock e Metal Na Lata, hoje se encontra no Rock Vibrations e é colaborador dos canais Tomar Uma e Papo de Peso. Primo de 2° grau do saudoso DJ Big Boy, Tarcísio curte Thin Lizzy, Marvin Gaye, Iron Maiden, Bob Marley e muitos outros artistas...

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